Título: China será 2º parceiro comercial da AL
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/04/2010, Economia, p. B7
Até 2020, a China vai se consolidar como segundo maior parceiro comercial da América Latina e do Caribe. Em meados da próxima década, esse cenário começará a ser estampado nas estatísticas, de acordo com um estudo divulgado ontem pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) que leva em conta a preservação da moeda chinesa valorizada.
A presença dos Estados Unidos no intercâmbio comercial de um conjunto de 16 países da região cairá expressivamente, enquanto a União Europeia tenderá a se mover em torno de sua atual posição.
O estudo "A República Popular da China e a América Latina e Caribe: Rumo a uma Relação Estratégica" teve como alavanca a visita do presidente chinês, Hu Jintao, a três países da região.
No Brasil, na próxima sexta-feira, Hu participará da reunião de cúpula do Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), na qual um dos temas mais críticos será o impacto da taxa de câmbio chinesa, artificialmente valorizada há anos, no comércio mundial, e a regulação do sistema financeiro internacional.
Yuan. "A maior contribuição que a China pode dar à economia mundial é a redução de seu superávit em conta corrente. A iniciativa fortaleceria seu mercado interno, valorizaria o yuan e reduziria as pressões inflacionárias", afirmou Osvaldo Rosales, diretor da Divisão de Comércio Internacional da Cepal e autor do estudo. "Mas não acredito que o câmbio chinês esteja na raiz de todos os males atuais. A China está madura para expandir suas exportações com base no aumento de produtividade."
O estudo aponta que, em 2014, a China pode ultrapassar a União Europeia e assumir a posição de segundo mercado de destino das exportações da América Latina e Caribe. Os Estados Unidos sofrerão acentuado decréscimo em sua atual posição, mas preservarão o primeiro lugar. Em 2020, com seu segundo posto consolidado, a China responderá por 19,3% das exportações da região. No ano passado, essa parcela foi de 7,6% - no caso do Brasil, de 13,2%.
Para montar essa previsão, Rosales mostrou-se conservador. Tomou como base a suposta manutenção da demanda americana e europeia pelos produtos latino-americanos e caribenhos, ao longo da década, e a redução pela metade do ritmo de compras da China no período, em relação à média dos anos 90. Também foi levada em conta a constatação de que a China "emergiu da crise fortalecida em sua base produtiva, tecnológica, financeira e com vínculos mais relevantes com a região da Ásia-Pacífico".
"Invasões". Em relação às importações, o comportamento será semelhante. A China consolidará o segundo posto em meados desta década e responderá por uma participação de 16,2% no total das compras externas da América Latina e Caribe em 2020. No ano passado, foi de 9,5% - de 12,46%, no caso do Brasil. O peso dos EUA encolherá de 33,1% para 26,1%, e a União Europeia manterá sua proporção em torno de 14%.
Segundo Rosales, esse avanço chinês provavelmente não afetará apenas fatias de mercado hoje atendidas por produtos americanos e europeus. Poderá também atingir o comércio entre os países latino-americanos e caribenhos, como se vê no caso das trocas entre Argentina e Brasil, prejudicadas pelas "invasões" chinesas, e gerar problemas tópicos em setores mais sensíveis.
Para se antecipar a possíveis controvérsias e à tendência de a China se perpetuar como importadora de commodities e exportadora de bens industrializados à região, a Cepal sugere que os países da América Latina e do Caribe criem um mecanismo formal de diálogo econômico e comercial com a China, a exemplo do que já fizeram a União Europeia e países da África.
OS TEMAS EM DISCUSSÃO NA MESA DOS BRICS Da regulação comercial global ao programa nuclear iraniano
1.Regulação mundial O Bric pretende adotar uma posição dura contra a tendência de frouxidão das economias mais ricas no compromisso de regular o setor financeiro. As promessas foram firmadas no G-20, em 2009, para evitar novas crises mundiais.
2.Reformas globais Dar um novo impulso aos projetos de reforma do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (Bird). Especialmente do Conselho de Segurança da ONU, no qual Brasil e Índia ambicionam ingressar como membros permanentes.
3.Moeda de referência Tema polêmico proposto no encontro de 2009, a adoção de uma nova moeda de referência para as reservas internacionais dos quatro países, em substituição ao dólar, deverá ser debatida apenas na reunião privada dos líderes. Não figura na pauta oficial do encontro de Brasília.
4.Moeda local de comércio Em 2009, foi apresentado pelo Brasil como medida para baratear e incentivar as trocas comerciais entre os 4 países. O tema não estará na agenda da cúpula, mas será discutido em seminário promovido pelo BC.
5.Investimento e comércio O estímulo aos negócios entre os quatro países será alvo de um seminário empresarial e de um encontro entre autoridades de bancos de fomento, no Rio, e de uma reunião de representantes de bancos privados. As dificuldades geradas pela taxa de câmbio da China, artificialmente desvalorizada, devem ser discutidas na reunião dos líderes e seus ministros.
6.Irã A crise sobre o programa nuclear iraniano tende a entrar na agenda de conversa dos líderes, por influência do Brasil e da China.
PARA LEMBRAR
A explosão da demanda chinesa por commodities foi a principal razão para o processo de "primarização" da pauta de exportações nacional no período, com a expansão do peso dos produtos básicos e o encolhimento da parcela representada por bens industrializados, que têm maior valor agregado. Há dez anos, a exportação de bens básicos respondia por 22,79% do total, enquanto a participação de manufaturados e semimanufaturados estava em 59,07% e 15,52%, respectivamente. Em 2007, ano anterior à eclosão da crise global, o porcentual de bens básicos aumentou para 32,12% e os relativos a manufaturados e semimanufaturados caiu para 52,2% e 13,57%.