Título: Bric reforça o poder individual de cada país
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/04/2010, Economia, p. B10

Talvez tenha sido o embaixador Marcos Azambuja quem melhor sintetizou a razão de Brasil, Rússia, Índia e China terem decidido transformar o acrônimo Bric, surgido em um relatório do Goldman Sachs, num grupo político do mundo real. Segundo Azambuja, quase nada recomendaria esse bloco, mas em um ponto a criação do Bric é vantajosa para todos: com ela, a importância global de cada um dos seus membros é amplificada, acelerando a redistribuição do poder aos emergentes.

A reunião dos chefes de Estado dos Brics na quinta-feira, em Brasília, deve ser entendida nesse prisma. Uma análise inicial do documento do encontro desperta ceticismo. Há, porém, pontos dignos de nota. Num deles, está escrito que "reiteramos (os chefes de Estado dos Brics) a importância que atribuímos ao status da Índia e do Brasil nos assuntos internacionais, e compreendemos e apoiamos a sua aspiração de ter um papel maior nas Nações Unidas".

O trecho aponta para a reivindicação de Índia e Brasil a um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Não é nada claro que Rússia e China (que têm assento) tenham interesse nisso, e a própria linguagem indireta abre espaço a recuos. Ainda assim, esse é o tipo de tema que poderia ser levado à mesa de negociações, dando ao Brasil e à Índia um poder que sozinhos não têm.

Em outra parte, está escrito que "nós sublinhamos a importância de manter relativa estabilidade das principais moedas de reserva e a sustentabilidade das políticas fiscais para que se alcance um crescimento econômico de longo prazo forte e equilibrado". O trecho parece ter o dedo chinês, já que o gigante asiático rebate as críticas sobre o câmbio semifixo e desvalorizado dizendo que é uma resposta à instabilidade do dólar.

Se a interpretação estiver correta, é um exemplo de como, "formando um grupo com os outros, a China pode esconder suas demandas nacionais por trás de um fachada multilateral" - a citação é de uma análise da Economist.

Esse, aliás, é um risco para os membros não chineses dos Brics. Com um PIB de US$ 4,9 trilhões em 2009, a China tem economia maior que Brasil, Rússia e Índia juntos, que tiveram um PIB de US$ 3,9 bilhões naquele ano. Se, por um lado, esses países ganham poder de fogo ao lado da China, por outro correm risco de serem atropelados pelos interesses da segunda potência global.

De qualquer forma, há interesses comuns nos quais a soma de forças vai contar pontos. O mais evidente é o de aumentar o poder de decisão dos Brics e de outros emergentes em instituições multilaterais como FMI e Banco Mundial - o que também está no comunicado final da reunião.