Título: Brasil sustenta PIB de 7%?
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/04/2010, Economia, p. B11

A economia da China cresce praticamente a 12% e, a nossa, 7%. Eles podem sustentar esse ritmo por algum tempo, nós não. Não há como comparar uma economia dirigida, num regime autoritário controlado pelo Partido Comunista (mesmo que só de nome) com a nossa, democrática, livre e aberta. Mas há algo em comum entre elas que merece consideração: são complementares, a China é nosso principal parceiro comercial e, como nós, enfrenta hoje o mesmo desafio - inflação que caminha para 5%, provocada pelo aquecimento da demanda interna. Na China, devido à injeção direta e indireta de mais de US$ 1 trilhão. Aqui, por desoneração tributária e incentivo monetário.

Outro fator que nos une: a China tem pelo menos US$ 200 bilhões para investimentos diretos no exterior, e nós precisamos deles para não depender apenas dos investimentos financeiros que estão entrando.

Fica a pergunta: podemos sustentar um crescimento de 7% por mais tempo?

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, acredita que este ano ainda será possível, mas a longo prazo, não. Estima que, se houver o necessário equilíbrio fiscal e monetário, em 2011 a economia deve crescer só 4%. Faltam reformas, falta investimento, falta muito.

"Não será fácil administrar a política econômica nos próximos anos. Há muitos desafios e, de novo, não nos preparamos adequadamente para isso. Na década de 90, fizemos inúmeras reformas e aproveitamos o bom momento mundial na década seguinte. Agora, não estamos fazendo mais nenhuma reforma importante", afirma ele, à coluna.

Efeitos, depois. Mas estamos crescendo mesmo sem as reformas. "Sim, entramos o ano com crescimento forte, mas não podemos nos esquecer de que há muito tempo não tínhamos tantos estímulos fiscais e monetários ao mesmo tempo. Suas retiradas no começo de ano só começarão a ser sentidas mais para frente, no fim do ano, provavelmente. Até lá, o crescimento será forte."

Dependendo dos dados do primeiro trimestre, a MB Associados acredita que o PIB pode ser maior do que os 6%, que previa, e até 7%, "algo que já vínhamos falando para os clientes",afirma Sergio Vale. Mas devemos ficar por aí.

Por quê? Para ele, há três questões fundamentais: como o BC deveria reagir para termos um crescimento sustentável? Quanto aos juros, um PIB maior coloca o BC ainda mais atrás da curva. Por isso, aumentam as chances de uma alta de 0,75. [ ][/ ]

Para Sergio Vale, o segundo motivo para afirmar que um PIB de mais 7% "é claramente insustentável", é do conhecimento de todos: não temos taxa de poupança nem de investimento. O terceiro fator é o déficit em conta corrente. Este ano ele não está tão ruim, diz Vale, pois vamos exportar mais graças, novamente, às commodities. Mas, pelo padrão de crescimento que se coloca para os próximos anos, iremos importar mais. "É inevitável que teremos déficits crescente em transações correntes. A consequência é certamente maior volatilidade do câmbio, pois não me parece haver capitais de longo prazo, a cada ano suficientes para financiar esse déficit."

E volatilidade na taxa de câmbio é o pior cenário para qualquer empresário. Para ele, uma apreciação contínua do câmbio está, agora, fora de questão. Conclusão? Ele deixa para a coluna. Com base nessa análise, podemos dizer que vai bem, sim, mas pode ser que não dure.