Título: Gastos causam déficit público recorde
Autor: Nakagawa, Fernando; Fernandes, Adriana
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/05/2010, Economia, p. B1

O Estado de S.Paulo

Gastos crescentes no início do ano eleitoral, despesas elevadas de juros e o efeito da inflação na dívida fizeram com que as contas públicas fechassem março com o pior desempenho já registrado pelo Banco Central para o mês: déficit de R$ 216 milhões, na série histórica iniciada em 2001. Significa que a forte arrecadação, impulsionada pela economia aquecida, não foi suficiente para cobrir as despesas, ficando esse "rombo". Foi também o primeiro trimestre com o resultado mais fraco e com maior despesa com juros. No período, o saldo primário (que não considera gastos com juros) ficou no azul em R$ 16,82 bilhões. Mas a despesa recorde de R$ 44,98 bilhões com juros fez com que o resultado nominal ficasse negativo em R$ 28,15 bilhões, o pior da série. O resultado da combinação perversa de superávit menor e juros maiores foi o aumento da dívida líquida do setor público. Ela subiu para 42,4% do Produto Interno Bruto (PIB), ante 42,1% do PIB em fevereiro. Mesmo com a recuperação da economia, as contas demoram a reagir porque os gastos crescem em ritmo superior ao da arrecadação. Em março, a receita do governo subiu 11,9% em comparação a igual mês de 2009. Já as despesas saltaram 41%. Juntos, os movimentos derrubaram o resultado. Para comparação, em março do ano passado, ainda em meio aos efeitos da crise, o governo havia conseguido economizar R$ 7,92 bilhões para pagar juros da dívida. Em março de 2010, ficou mais de R$ 200 milhões no vermelho, contrariando as previsões de superávit em torno de R$ 2,5 bilhões. O chefe do departamento econômico do BC, Altamir Lopes, reconheceu que, até agora, o superávit acumulado em 12 meses - de 1,94% do PIB - está bem abaixo da meta de 3,3% para o ano, o que indicaria a necessidade do abatimento das despesas do PAC para cumprir a meta. Apesar do fraco desempenho, ele não demonstra preocupação e diz que, com o resultado de abril, as contas entram na normalidade. "E, aí, poderemos fazer uma avaliação mais criteriosa." Muito rápido. "Os números preocupam porque, apesar de a arrecadação se recuperar, as despesas ainda estão avançando muito rápido. Para cumprir a meta, o governo vai precisar abater investimentos", diz o analista do Banco BBM, Hui Lok Sin. Pelas regras atuais, o governo pode abater investimentos de valor equivalente a cerca de 1 ponto do PIB da meta, o que reduziria o alvo para 2,3% do PIB. Também há impacto na inflação. Se o governo não contiver as despesas, afirmam analistas, o BC terá de aumentar ainda mais os juros para conter os preços. Ontem, essa leitura ajudou a subir os juros no mercado futuro. Há, ainda, outro foco de deterioração das contas. Apesar de a taxa Selic estar hoje em nível menor que há um ano, o pagamento de juros da dívida aumentou. Na comparação anual, o gasto mensal cresceu 14,9% e somou R$ 16,85 bilhões em março. No trimestre, avançou 12,6%. Segundo Altamir, o valor cresce porque a inflação eleva o pagamento em títulos atrelados a esses indicadores. O melhor exemplo é o Índice Geral de Preços ao Mercado (IGP-M), que passou de deflação de 0,74% em março do ano passado para alta de 0,94% em igual mês de 2010. Atualmente, 31,4% da dívida pública acompanha a inflação.