Título: Câmara derrota Lula e aprova 7,7% para aposentado e fim do fator previdenciário
Autor: Madueño, Denise
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/05/2010, Economia, p. B1

Governo não consegue barrar festival de emendas à medida provisória, que criam despesa adicional de R$ 5,6 bi - R$ 1,8 bi já neste ano O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA

Em menos de duas horas, no dia em que a Lei de Responsabilidade Fiscal completou dez anos, o Planalto sofreu duas derrotas que, segundo cálculos dos técnicos do Câmara, criam uma despesa adicional de R$ 5,6 bilhões a partir do ano que vem ? R$ 1,8 bilhão já terão de ser gastos neste ano.

O governo foi derrotado ontem na votação da MP de reajuste das aposentadorias de valor acima de um salário mínimo ? os deputados aprovaram um índice de 7,7% ? e o fim do fator previdenciário a partir de 1.º de janeiro do próximo ano.

De forte apelo popular em ano eleitoral, os deputados preferiram transferir ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva o desgaste político com o vetar das propostas. A MP ainda será votada no Senado, onde os líderes da base já anunciaram apoio aos 7,7%. "Foi a noite da irresponsabilidade fiscal", reagiu o deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP).

Os 7,7% de reajuste aprovados ontem à noite, retroativos a 1.º de janeiro deste ano, em vez da proposta negociada na semana passada, de 7%, são a soma da inflação passada e 80% da variação do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2008. A MP assinada pelo presidente Lula, em vigor desde o início deste ano, fixou 6,14%, resultado da recomposição da inflação mais 50% do crescimento do PIB.

O governo alega não ter condições para pagar aos aposentados mais que os 7%. Esse índice representa cerca de R$ 1,1 bilhão a mais do que será gasto com os 6,14%. Para pagar os 7,7%, serão mais R$ 700 milhões.

Bancadas liberadas. Na votação de ontem, a oposição tentou aprovar 8,7%, mas foi derrotada pelos governistas. Discursaram a favor do índice apenas o DEM, o PSDB, o PPS e o PSOL. Nessa votação, o placar registrou 193 votos contrários e 166 votos a favor, com uma abstenção.

O impacto do fim do fator previdenciário nos cofres públicos é estimado em R$ 3,8 bilhões em 2011, segundo estudo dos técnicos que acompanham o assunto na Câmara. O fator é usado para calcular o valor das aposentadorias levando em conta a alíquota de contribuição, o tempo de contribuição, a idade e a expectativa de vida do trabalhador.

O mecanismo do fator previdenciário foi aprovado no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) para desestimular aposentadorias precoces e beneficiar trabalhadores que se mantivessem no mercado de trabalho. Até mesmo o PSDB, partido do ex-presidente, liberou a bancada para que os deputados votassem como quisessem. O placar registrou 323 votos a favor, 80 contra e duas abstenções.

A emenda aprovada foi apresentada pelo líder do PPS na Câmara, Fernando Coruja (SC). "Representa a volta do cálculo justo, uma vez que os aposentados vinham sofrendo um achatamento do poder de compra por causa da corrosão inflacionária", justificou Coruja.

Na votação que resultou no reajuste de 7,7% para as aposentadorias, nem mesmo o PT ficou unido na defesa do parecer do relator, Cândido Vaccarezza, que previa os 7%. O PT liberou os deputados da bancada. Todos os demais partidos, de oposição e governistas, encaminharam o voto a favor da proposta de 7,7%, apresentada pelo deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), e defendida pela própria base. Com a evidente vitória da proposta, a votação foi simbólica, sem o registro dos votos no painel eletrônico, poupando os petistas fiéis ao governo, que votariam contra, de terem seus nomes expostos.

Líder derrotado. A votação de ontem foi mais uma derrota do líder do governo. Desde o fim de fevereiro, Vaccarezza perdeu votações importantes na Câmara. Contrariando o governo, os deputados da base incluíram o uso do dinheiro do Fundo Social para recompor o valor de aposentadorias no projeto do marco regulatório de exploração do pré-sal e a distribuição dos royalties entre todos os Estados.

Os líderes da base argumentaram que não podiam votar um índice menor do que o acertado pelos senadores, de 7,7%, porque seria um grande desgaste político com os aposentados em ano eleitoral. Os deputados temem que o Senado apareça como responsável por um aumento mais generoso para os aposentados do que a Câmara.