Título: Capitalização da Telebrás fica para novo governo
Autor: Marques, Gerusa ; Andrade, Renato
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/05/2010, Economia, p. B12

ENTREVISTA Rogério Santanna, Secretário de Logística do Ministério do Planejamento

O governo vai fatiar a capitalização da Telebrás. A maior parcela de recursos - cerca de R$ 1,5 bilhão dos R$ 3,2 bilhões previstos - será injetada na estatal em 2011, já durante o novo governo, segundo revelou o futuro presidente da empresa, Rogério Santanna, atual secretário de Logística do Ministério do Planejamento. "Vamos investir um pouco mais no primeiro ano porque é quando teremos mais gastos", disse o executivo, em sua primeira entrevista após ter aceito o convite para dirigir a estatal, que continuará usando o nome Telebrás. Apesar das incertezas em relação ao cronograma de execução do Plano Nacional de Banda Larga, anunciado na quarta-feira, e das muitas críticas recebidas, Santanna insiste que o programa vai promover concorrência e beneficiará o consumidor, especialmente nas regiões que atualmente não são atendidas pelas empresas privadas. A seguir os principais trechos da entrevista:

A capitalização da Telebrás acontece ainda este ano?

Isso tem de ser preparado para o ano que vem. Mas a empresa tem recursos suficientes para começar a operar neste ano.

A injeção de recursos do Tesouro será feita toda em 2011?

Nos próximos três anos. Vamos investir um pouco mais no primeiro ano, cerca de R$ 1,5 bilhão, porque é quando teremos mais gastos. Tem de haver um orçamento de investimento e capitalização em estatais. Como esse ano não tem previsão de investimento, isso tem de estar na proposta de Orçamento do ano que vem. A partir do segundo e do terceiro ano teremos de continuar investindo, mas a empresa já vai estar gerando receita.

Os acionistas minoritários devem aderir à capitalização?

Certamente. Veja o que aconteceu em 2008 quando houve um aporte de R$ 200 milhões. A empresa recebeu mais R$ 3 milhões dos minoritários.

Em quanto tempo a empresa estará efetivamente funcionando?

Acredito que em uns dois meses. Recolocando as diretorias e a nova estrutura operativa e com o retorno dos funcionários cedidos à Anatel, cerca de 60 técnicos e outras 30 pessoas, nós podemos começar a funcionar.

É um desafio assumir a Telebrás agora?

Sem dúvida. Mas aprendi ao longo desse tempo no governo que é mais difícil aprovar os projetos do que executá-los. Não faltarão aves de mau agouro para que o projeto não funcione.

Existem muitos focos de resistência?

A gente sabe de onde vem a resistência. As empresas que vão ser afetadas, naturalmente vão reagir. Espero que consigam compreender que elas podem operar em conjunto, mas vão ter de sair da zona de conforto, porque terão concorrência. Apesar de estarem reclamando, elas vão participar. Todas elas vão se beneficiar. Vão reclamando, chiando, mas vão.

A capitalização ficará para o próximo governo. A operação não pode ser abortada, caso a oposição vença as eleições de outubro?

Risco sempre há. Construir qualquer coisa é difícil, mas desmanchar é fácil. Mas acredito que o País chegou num grau de maturidade em que não vai desperdiçar seus ativos, deixar de utilizá-los para resolver um problema.

Todo o plano depende de uma solução definitiva para o imbróglio jurídico sobre a rede de fibras ópticas da Eletronet?

Não depende. Primeiro porque o sistema elétrico tem fibras que não estão de posse da Eletronet. Além disso, há trechos paralelos da Petrobrás. Mesmo num cenário onde eu não consiga colocar a mão em fibra nenhuma, dá para fazer o plano. Tem trecho para tudo, solução para tudo.

O que garante que haverá adesão dos provedores de internet para chegar à meta de 40 milhões de conexões em 2014?

Há várias razões. Tenho recebido muitos provedores que dizem que não conseguem prestar os serviços porque não têm redes. Não são só os pequenos, são as próprias operadoras. Em alguns lugares elas detêm redes e em outros, não. A Telefônica, por exemplo, não tem rede fora de São Paulo.

A Telebrás vai vender capacidade de transmissão só para quem oferecer os serviços a R$ 35?

Nós vamos oferecer redes a R$ 230 (o megabit) a quem se comprometer a vender na ponta a R$ 35 e atender a um padrão de qualidade. Mas não é limitado a uma velocidade de 784 quilobits por segundo. Esse é um pacote de entrada. Queremos fazer da banda uma commodity. Quanto mais banda for vendida, mais barata fica, e isso vai determinar que os detentores de infraestrutura baixem seus preços.

O pacote de R$ 15 depende da adesão das operadoras móveis?

Depende. É uma meta de tentar obter um preço mais barato. A alegação delas é que o modem custa caro. Vamos tirar os impostos e separar o modem dos serviços. É um programa paralelo, que pode acontecer neste ano.

Esse valor de R$ 35 é para o Brasil todo?

Sim. Vamos começar a trabalhar, por uma questão de não ter recursos suficientes, no Sudeste, onde estão os principais órgãos públicos, como Polícia Federal, Receita Federal.

Em 2010, no projeto-piloto de 100 cidades, vão ser atendidos apenas órgãos de governo?

Nossa meta é chegar em 98 pontos de governo nesses lugares.

A partir daí, nada impede de a gente fazer acordo com os provedores locais.

Como evitar uma escolha eleitoreira das cidades?

Vai depender do projeto da prefeitura. Tem que ser um programa que independa da coloração partidária. Quem tiver um bom projeto vai participar.

O governo fez muita coisa para que a Oi pudesse se estabelecer. Por que agora não houve uma aposta para ampliar o "campeão nacional"?

O fato de ter uma empresa brasileira forte é importante, mas o monopólio não é bom para negócio nenhum, independente de ser uma empresa brasileira ou uma empresa estrangeira. Monopólio é ruim.

Fazer banda larga com a Oi seria monopólio?

O que eles nos pediram era fortalecer o monopólio. Nada nos garantiria que agora, atingidas as condições, o preço no futuro se mantivesse.

QUEM É

CV: Natural de Porto Alegre, Rogério Santanna, de 53 anos, é um dos idealizadores do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL). É membro do Comitê Gestor da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileiras (ICP-Brasil) e Conselheiro no Comitê Gestor da Internet do Brasil (CGI.Br). Formado em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Santanna é filiado ao PT.