Título: Só resta o veto de Lula
Autor: Velloso, Raul
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/05/2010, Economia, p. B2

O Estado de S. Paulo O grande drama do Brasil no campo econômico é a desabada das taxas de crescimento do PIB (ou da geração de empregos) desde os anos 70. Antes o País crescia a taxas médias entre 7% e 8% ao ano, e 30 anos depois passamos a uma taxa média sustentável um pouco abaixo de 3% ao ano. Mais recentemente, graças a um inédito bônus externo, a taxa potencial escalou para 4,5% ao ano, mas esta ainda está bem abaixo das nossas necessidades. Se neste espaço coubesse um gráfico conjunto das taxas de crescimento do PIB e da proporção do PIB que é investida em expansão de capacidade produtiva, a explicação básica estaria ali. Há décadas que os dois gráficos têm andado bem juntos, a queda do segundo explicando a desabada do primeiro. Em 1975 se investiam 26% do PIB. No fundo do poço, em 2003, essa taxa caiu para 13%, enquanto o crescimento do PIB caía também pela metade. Há pouco o investimento voltou para 16% do PIB, empurrando o crescimento potencial um pouco para cima. Para crescer como no passado, precisaríamos investir bem mais, algo ao redor dos antigos 26% do PIB. Primeira mensagem relevante para um ano eleitoral: é preciso recuperar a taxa de investimento para o País poder crescer mais economicamente. Como fazer isso? Ressalte-se primeiro que o Brasil crescia junto com a China nos anos 70 e bem acima da média mundial. Já no final dos anos 80 passamos a crescer abaixo da média (e até hoje, basicamente, não saímos disso), enquanto a China cresce há 30 anos ao redor de 10% ao ano. Comparações internacionais são complicadas, mas o fato é que ficamos bem para trás na corrida mundial do crescimento dos países. Deve-se registrar ainda que em boa parte da fase mencionada foram as administrações públicas que puxaram a queda dos investimentos, enquanto, nestas, a União caía na frente. Na área federal, o Ministério dos Transportes, que tem o maior peso no total dos investimentos, puxou o andor. Os investimentos privados caíram muito também - eles, que são o carro-chefe da economia de mercado. Na raiz dessa queda toda está o crescimento excessivo dos gastos públicos correntes, comandado pelo modelo de crescimento de gastos com pessoal, Previdência e assistência social, entre outros itens de peso, consagrado na Constituição de 1988. Com gastos correntes em permanente ascensão, e dado que a extração tributária tem limites superiores óbvios, sobra menos espaço para investir no setor público, especialmente nas fases críticas em que parcela relevante da receita tem de ser destinada ao pagamento de parte do serviço da dívida pública. Além disso, gastos correntes excessivos provocam engarrafamento no tráfego da demanda agregada, quando se juntam com investimentos privados também significativos e em ascensão, mercê, nesse último caso, não de decisão política, mas de estímulos econômicos naturais, como os que vinham ocorrendo em face do boom mundial de 2003 a 2008. Como nem tudo o que se demanda pode vir do exterior, e como o governo não se ajusta, o congestionamento de gastos acaba provocando mais inflação e o Banco Central tem de subir a taxa básica de juros para desestimular os gastos privados. Por trás, a carga tributária é excessiva e suga para os programas governamentais - muitos dos quais duvidosos - a seiva que poderia alimentar investimentos privados. Outro problema sério é que a administração federal desaprendeu a investir nesses anos todos de escassez. A diferença entre os investimentos autorizados no Ministério dos Transportes e sua execução efetiva é gritante. Em síntese, a proporção dos investimentos nos gastos federais correntes tem caído significativamente desde os anos 70, saindo de patamares provavelmente acima de 15% para chegar aos meros 3,6% no ano passado, após atingir o ponto mínimo de 1,3%, em 2003. Parte disso se deve à queda dos investimentos; parte, à gigantesca subida dos gastos correntes. Por outro lado, a gestão pública tem de melhorar, e muito. No miolo das despesas, gastamos mais em pessoal do que os países que seriam economicamente comparáveis conosco. O Brasil gasta quase 12% do PIB em Previdência, incluindo a de servidores, enquanto a média de países com idêntico grau de envelhecimento recomendaria gastar apenas algo entre 3% e 4% do PIB! A diferença é dada por gastos sem qualquer cobertura de contribuições, alguns válidos, outros nem tanto - nestes se incluindo as aposentadorias absurdas de funcionários públicos. E sem falar no fato altamente relevante de que o envelhecimento no Brasil está se dando a uma maior velocidade do que ocorreu nos países desenvolvidos. Nesse contexto, a decisão da Câmara de aumentar ainda mais o valor das aposentadorias dos que ganham acima de um salário mínimo e de extinguir o mecanismo de cálculo de aposentadorias conhecido como "fator previdenciário", que busca ligar benefícios a contribuições e punir financeiramente aposentadorias precoces, vai na contramão do que precisa ser feito no País. Se o Senado embarcar nessa onda, só resta o veto de Lula.