Título: Cristina nega a imposição de barreiras
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/05/2010, Economia, p. B8
Presidente argentina diz que "não houve restrição" à compra de alimentos que rivalizem com os produzidos no país
Após uma semana de fortes pressões por parte de empresários e governos da União Europeia (UE) e Brasil - e ameaças de retaliação dos principais sócios comerciais da Argentina -, a presidente Cristina Kirchner exibiu ontem um insólito recuo em sua política protecionista, negando a existência de restrições à importação de alimentos não frescos que rivalizem com similares produzidos na Argentina.
"Não houve restrições, de forma alguma", afirmou impassível a presidente Cristina em Madri à agência estatal argentina de notícias Télam.
Embora negada pela presidente Cristina, a polêmica medida de proibição da importação de alimentos não frescos havia sido emitida há duas semanas pelo secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, definido por analistas, líderes da oposição como o homem que "faz o trabalho sujo dos Kirchners".
Ordem verbal. A proibição para a entrada de alimentos não frescos, que entraria em vigência no dia 1.º de junho, era puramente verbal, como grande parte das ordens de Moreno, que costuma telefonar a empresários para impor medidas sem resolução ou decreto por escrito que as oficialize.
A medida implicaria em obstáculos para a entrada de produtos como o presunto cru espanhol e italiano, além do milho em lata e o chocolate brasileiro.
Cristina Kirchner desembarcou na capital espanhola para participar da reunião de cúpula de países da América Latina e União Europeia. As declarações da presidente Cristina sobre a inexistência da controvertida medida foram feitas durante a reinauguração dos escritórios da companhia aérea estatal Aerolíneas Argentinas.
"Não devemos nos impressionar pelo fato de que existam interesses comerciais de um lado e de outro. Temos de ser sensatos, realistas, inteligentes, ver toda essa história e "não ver a palha no olho alheio" (expressão bíblica usada costumeiramente no idioma espanhol para indicar que alguém enxerga pequenos defeitos nas outras pessoas e não percebe grandes defeitos em si próprio)", explicou Cristina.
Na sequência, a presidente arrematou com tom conciliador: "Precisamos ter uma visão mais completa para encontrar soluções para a escala global dos problemas que temos atualmente".
Na semana passada, Moreno havia declarado em reunião com a Câmara de Importadores da Argentina, que a medida - negada por Cristina Kirchner - pretendia reduzir em pelo menos US$ 300 milhões o volume de produtos alimentícios não frescos importados que rivalizassem com os similares argentinos.
Fonte do governo argentino confirmou à Agência Estado que a medida seria parte de uma manobra negociadora da Argentina junto à União Europeia e aos próprios sindicatos do setor de alimentos argentinos. Os trabalhadores se encontram em plena negociação de reajustes salariais, sem nenhum indicativo de acordo. / COLABOROU MARINA GUIMARÃES
Para lembrar As medidas protecionistas argentinas em grande escala contra o Brasil datam de 1999. Houve picos em 2004, quando o então presidente Néstor Kirchner (2003-2007), marido e antecessor da presidente Cristina Kirchner desatou a "Guerra das Geladeiras" (barreiras contra a linha branca e também televisores produzidos pelo Brasil). A onda protecionista retornou com força em meados de 2008, embalada pela crise financeira mundial. Posteriormente, aumentou com a designação da economista Debora Giorgi - apelidada de Senhora Protecionismo - para o cargo de ministra da Produção.