Título: A goela larga do Congresso e o jogo de cena
Autor: Simão, Edna
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/06/2010, Economia, p. B4

O espírito eleitoral que presidiu a decisão de conceder 7,72% aos aposentados que recebem benefícios acima do piso mínimo da Previdência contaminou por completo o Congresso. A partir de agora, o governo não tem mais que duas opções para encarar as bombas fiscais espalhadas pelas pautas das comissões e do plenário da Câmara e do Senado. Ou vota - e perde a votação - ou pura e simplesmente barra a votação.

Depois de passar duas semanas fazendo discurso e pose de responsável fiscal, para depois aprovar o reajuste de 7,72% para os aposentados que ganham acima do piso mínimo - contra 6,14% da MP enviada inicialmente ao Congresso -, o presidente Lula tonificou o apetite eleitoral já pantagroélico dos parlamentares. E, como revelou ontem a votação do projeto do senador Paulo Paim (PT-RS), na CCJ da Câmara, não há distinção partidária na goela larga dos deputados.

A proposta é do PT, o relator na CCJ foi do PMDB (Marçal Filho/MS), mas o apoio explícito contou com os discursos de Ronaldo Caiado (DEM-GO), Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), Régis de Oliveira (PSC-SP) e João Campos (PSDB-GO), só para citar alguns exemplos.

A recomposição dos valores das aposentadorias é uma das três propostas que o senador Paim sempre defendeu à luz do dia. Para não confrontar o aliado carnal, o Planalto foi empurrando com a barriga, arrastando as votações de comissão em comissão. Um dos projetos é de 2007.

Em 2010, no ano eleitoral, diante de uma base governista que já entendeu o esforço eleitoral do Planalto, o que aparecer no plenário e ajudar os parlamentares a melhorar a imagem junto ao eleitor é tiro e queda. Se Lula, com mais de 70% de popularidade medida pelas pesquisas, se entrega a processos de "emergência eleitoral", por que os deputados e senadores têm de ir para a dura competição das urnas sem fazer um chamego nos eleitores?!

O discurso, ontem, no plenário da CCJ, era sempre o mesmo e na linha do "não me venham dizer que não há dinheiro no cofre da União". A frase de João Campos diz tudo: "Não podemos mais acreditar quando eles (equipe econômica) dizem que o gasto vai inviabilizar o País. Eles (os ministros Mantega e Paulo Bernardo) fazem jogo de cena para, depois, valorizar a sanção presidencial".

É JORNALISTA DO "ESTADO"