Título: Demanda robusta força juro alto, justifica Copom
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Fonte: O Estado de São Paulo, 18/06/2010, Economia, p. B5

Ata da reunião do comitê do BC diz que a Selic subiu para tentar deter "a concretização de um cenário inflacionário" e indica que juros devem subir 0,75 ponto porcentual na próxima reunião

Fábio Graner e Fernando Nakagawa, BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo Mesmo com a incerteza externa trazida pela crise na Europa, o Comitê de Política Monetária (Copom) deixou claro que está com o foco direcionado em conter o ímpeto da economia brasileira e evitar uma escalada dos preços. Em ata divulgada ontem, a diretoria do Banco Central enxergou nova "deterioração" na inflação.

A piora do quadro, na visão do BC, acontece porque a demanda doméstica está "robusta" e a economia ganha ainda mais velocidade com estímulos fiscais e aumento do crédito. Por isso, a instituição manteve a postura "incisiva" de subir os juros em 0,75 ponto porcentual na última reunião, para 10,25%.

O texto reforça a aposta de que novo aumento idêntico, de 0,75 ponto porcentual, deve acontecer na próxima reunião e deixou claro que, para o Copom, os riscos para a inflação continuam "elevados" mesmo após a retirada de alguns benefícios criados para amenizar os efeitos da crise internacional no fim de 2008. "A despeito da reversão de parcela substancial dos estímulos introduzidos durante a recente crise financeira internacional, desde a última reunião permaneceram elevados os riscos à concretização de um cenário inflacionário benigno", diz o documento.

Diante desse quadro, a atuação da autoridade monetária é claramente pautada pelo objetivo de jogar água na fervura da demanda interna e evitar que a procura por bens acima da oferta provoque elevação de preços.

Para o BC, a despeito de "contribuições pontuais e sazonais" para a elevação dos índices de preços ao consumidor, o cenário inflacionário tem, de fato, ficado pior em função desse suposto "descompasso" entre oferta e demanda.

Ponto de vista. Essa avaliação diverge do Ministério da Fazenda, que tem defendido a tese de que a alta da inflação tem sido provocada essencialmente por choques específicos ou sazonais e que, agora, o cenário já seria favorável, com a inflação tendendo a convergir à meta ao longo dos próximos meses.

Ainda ontem o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou o índice oficial de inflação ficará "bem comportado" nos próximos meses. Segundo ele, já se verifica uma queda da inflação dos alimentos desde maio, que eram os itens que mais pressionavam a inflação no começo do ano. "Queria avisar que a inflação está caindo", ironizou. "Era choque de oferta, como eu dizia", acrescentou.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva negou ontem que haja um risco de a oferta não atender à demanda por produtos, o que aceleraria a inflação no País.

A atenção com a demanda doméstica, porém, é tão grande que nem a piora do quadro externo faz o Banco Central mudar o tom. Na ata, os membros do Copom afirmam que os riscos para a trajetória da inflação "se circunscrevem essencialmente ao âmbito interno". Para o comitê, a Europa segue em situação de monitoramento, mas, por ora, o discurso é de que não há mudança na avaliação.

"A ata revelou um consenso entre seus membros de que o cenário inflacionário continua preocupante, mesmo considerando os fatores sazonais", diz o diretor de pesquisas e estudos econômicos do Bradesco, Octavio de Barros, em relatório aos clientes.

Segundo o texto, os efeitos da economia aquecida e a demanda elevada já se refletem no aumento dos núcleos dos índices de inflação. / COLABORARAM CÉLIA FROUFE E LEONARDO GOY

TRECHOS

"A demanda doméstica se apresenta robusta, em grande parte devido aos efeitos de fatores de estímulo, como o crescimento da renda e expansão do crédito"

"A despeito da reversão de parcela dos estímulos introduzidos durante a crise, desde a última reunião permaneceram elevados os riscos de um cenário inflacionário"