Título: Lula cancela ida ao G-20 por causa das cheias no Nordeste
Autor: Monteiro, Tânia
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/06/2010, Economia, p. B12

Presidente fica no País "monitorando o atendimento às vítimas das enchentes", mas diplomatas preveem que Lula vai ser criticado

Apesar do risco de sofrer críticas dos países ricos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu cancelar sua participação na reunião do G-20, em Toronto, neste fim de semana.

O anúncio foi feito ontem pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, após se reunir com o presidente Lula, no Palácio da Alvorada. Segundo Amorim, Lula decidiu permanecer no Brasil "monitorando o atendimento às vítimas das enchentes do Nordeste", porque "ficou impressionado" e "chocado" com a destruição que viu durante visita às cidades atingidas em Pernambuco e Alagoas, na quinta-feira.

Diplomatas ouvidos pelo Estado comentaram, no entanto, que o presidente Lula poderá ser criticado por ter cancelado a viagem, já que poderia monitorar as ações no Nordeste de qualquer lugar. O principal motivo da crítica seria o fato de Lula ter feito inúmeros esforços para estar presente no Irã e em outros países para tentar ajudar o país a evitar as sanções da Organização das Nações Unidas (ONU) e, na hora de comparecer ao G-20, onde estava sendo esperado por todos os presidentes dos países ricos, preferiu não ir, alegando necessidade de permanecer no Brasil. No encontro, o presidente alertaria a Cúpula do G-20 para as consequências de medidas de austeridade fiscal, porque um aperto exagerado pode comprometer a recuperação da economia mundial.

Ao justificar a sua decisão de não ir mais a Toronto, Lula citou que fato semelhante já aconteceu com diversos presidentes cujos países sofreram com calamidades. Comentou, por exemplo, o caso do terremoto ocorrido na China, em junho, que matou mais de 600 pessoas e levou o presidente Hu Jintao, que estava no Brasil, participando da 2ª Cúpula do Bric (grupo formado por Brasil, Índia, Rússia e China), a antecipar seu retorno.

Amorim tentou dissociar o cancelamento da viagem ao Canadá da decisão da ONU, liderada pelos Estados Unidos, de aprovar sanções ao Irã por causa do programa nuclear do país, depois de o Brasil, ao lado da Turquia, tentar impedir que elas acontecessem. "O Irã não vai ser discutido no G-20, que trata de temas econômicos", afirmou Amorim. Lembrado que o G-8 trataria do programa nuclear iraniano e as sanções ao país, o ministro das Relações Exteriores respondeu: "Primeiro, o Irã não vai ser discutido no G-20, que trata de temas econômicos. E o G-8 é o G-8 e nós não temos nada a ver com o G-8. Não somos do mesmo clube". Amorim insistiu que Lula cancelou a ida ao Canadá por causa das enchentes no Nordeste.

Cancelamento. Lula decidiu cancelar o compromisso já na viagem de volta do Nordeste, na noite de quinta-feira, e comunicou o fato ontem ao ministro Celso Amorim . O presidente tinha dito que queria, na reunião do G-20, cobrar dos governantes, além dos compromissos com a retomada do crescimento da economia mundial, a reforma de poder de voto no FMI, o reforço das regras internacionais da regulação e supervisão do sistema financeiro e a conclusão da Rodada Doha de negociações comerciais na OMC.

Só que acabou desistindo da viagem, alegando o problema das enchentes e o fato de essa reunião em Toronto ser eminentemente econômica e que o encontro do G-20 mais importante será no fim do ano, em Seul, na Coreia do Sul.

De acordo com Celso Amorim, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que já está em Toronto, vai representar o presidente Lula na reunião.

Amorim lembrou que "o G-20 tem temas estritamente econômicos" e Mantega "está mais do que capacitado a tratar de todos os temas". Depois de comentar que a reunião importante do G-20 ocorrerá somente no fim do ano, em Seul, onde Lula avisou que estará presente, o ministro Amorim justificou que o encontro de hoje e amanhã funcionará, na verdade, como uma espécie de preparatória para o que vai acontecer na Coreia.