Título: Ministro do STJ é punido, mas mantém salário
Autor: Gallucci, Mariângela
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/08/2010, Nacional, p. A13

Em decisão inédita, Conselho Nacional de Justiça pune Paulo Medina, acusado de vender sentenças judiciais, com aposentadoria compulsória STJ

Pela primeira vez em seus cinco anos de funcionamento, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu ontem punir administrativamente um ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Por unanimidade, os 15 conselheiros do CNJ concluíram que o ministro afastado do STJ Paulo Medina não tem reputação ilibada e, por esse motivo, deve ser punido com a aposentadoria compulsória. A punição, porém, preservou o salário de Medina, que será aposentado com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. Como ele está na magistratura desde 1968, deverá receber o salário integral dos ministros do STJ, que é de R$ 25.386,97.

Outra provável consequência da decisão do CNJ é que a ação penal aberta contra ele em 2008 pelo Supremo Tribunal Federal (STF) poderá ser transferida para a Justiça de 1.ª Instância. Como Medina foi aposentado, em tese ele perde o direito ao foro privilegiado no STF. Com a transferência, a defesa poderá ganhar tempo e adiar uma decisão definitiva da Justiça - que, em caso de condenação, levaria, aí sim, à perda da aposentadoria.

O processo contra Medina no STF acusa o ministro de crimes de prevaricação e corrupção passiva, por suposto envolvimento num esquema de venda de decisões favoráveis a empresários do ramo de jogos de azar. O esquema foi investigado pela Operação Furacão, da Polícia Federal. Segundo as investigações, ele teria recebido cerca de R$ 1 milhão para liberar máquinas de caça-níqueis no Rio.

No julgamento de ontem, os integrantes do CNJ seguiram o voto do relator, o corregedor nacional de Justiça, Gilson Dipp. Este, como Medina, é ministro do STJ. Dipp concluiu que as condutas eram incompatíveis com as funções de um juiz e que ele deveria ser punido.

Reputação. Além de Medina, foi punido com aposentadoria o desembargador do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2.ª Região José Eduardo Carreira Alvim, também por suposto envolvimento no esquema. O Estado não conseguiu, até o fechamento desta edição, saber do TRF o valor da aposentadoria a ser recebida por Carreira Alvim.

"Mostra-se totalmente inconveniente o retorno dos referidos às atividades judicantes tendo em vista a quebra da confiança, honorabilidade e imparcialidade", afirmou Dipp no julgamento. Ele mencionou ainda o art. 35 da Lei Orgânica da Magistratura, onde se determina, no inciso VIII, que é dever de um magistrado "manter conduta irrepreensível na vida pública e particular".

O conselheiro Yves Gandra Martins observou que "todo cidadão tem direito de ser julgado por um juiz de reputação ilibada". E, prosseguiu, há um trecho no processo onde o acusado se dirige a um advogado com a frase "quem manda aqui é você". Em sua intervenção, o vice-presidente do CNJ, Carlos Ayres Britto, acrescentou: "As decisões (de Medina) foram proferidas numa ambiência de fortes indícios de espúria negociação".

Recurso. Os advogados de Medina e Carreira Alvim sustentaram que não havia provas do suposto envolvimento deles com o esquema. Um deles, Antonio Carlos de Almeida Castro, disse que vai primeiro conversar com seu cliente para definir o que fazer. Em tese, os dois punidos têm o direito de recorrer ao Supremo.

A notícia do suposto envolvimento de Medina e Carreira Alvim com venda de decisões judiciais abalou o Judiciário - os dois gozavam de muito prestígio nos meios jurídicos. Medina foi presidente Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e da Federação Latino-Americana de Magistrados. Carreira Alvim, nome frequentemente citado por magistrados para embasar seus julgamentos, é autor de uma série de livros tidos como referência em diversas áreas do Direito.

Sem desconto

R$ 25.386,97 é o valor da aposentadoria que Medina receberá mensalmente

Quebra de confiança

GILSON DIPP CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA

"Mostra-se totalmente inconveniente o retorno dos referidos às atividades judicantes tendo em vista a quebra da confiança, honorabilidade e imparcialidade"