Título: Desastre no Paquistão abre portas ao Taleban
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/08/2010, Internacional, p. A12

Milícia tenta se aproveitar do caos no país para avançar em áreas devastadas

Desabrigados. Vítimas das inundações deixam suas casas em Sukkur: 1,6 mil paquistaneses morreram nos últimos dias

As inundações que devastaram a infraestrutura do Paquistão podem abrir a porta ao fortalecimento do Taleban, dizem as autoridades. O panorama nas áreas onde o nível da água baixou é de pontes, estradas, escolas, hospitais, usinas elétricas e sistemas de esgoto inteiramente em ruínas ou seriamente danificados. Com os rios ainda cheios e seguindo na direção do sul, a destruição aumenta a cada hora.

Em visita a uma área inundada, no sul do país, ontem, o primeiro-ministro, Yousaf Raza Gillani, declarou que o impacto das inundações equivale ao terremoto na Caxemira em 2005 - opinião compartilhada pela equipe de ajuda internacional.

Embora o terremoto tenha provocado a morte de um número muito maior de pessoas - pelo menos 73 mil, em comparação com as 1,6 mil mortas nas enchentes -, o premiê disse que os danos físicos estão "além da imaginação". "Nosso país retrocedeu alguns anos", disse.

O retrocesso torna mais difícil a batalha contra o Taleban, responsável por uma insurgência feroz que vem procurando tirar proveito da incapacidade do governo em prover os serviços mais básicos para a população.

Durante o ano passado, o Exército paquistanês conseguiu retirar os talebans de seus principais santuários, no Waziristão Sul e no Vale do Swat. Mas os danos provocados pelas enchentes podem colocar em risco esses ganhos, admitem as autoridades, se a infraestrutura não for rapidamente reconstruída - o que deverá custar bilhões de dólares e provavelmente exigirá alguns anos.

O Vale do Swat, uma das áreas mais afetadas, é um exemplo disso. Embora o lugar fosse conhecido pelas atitudes moderadas de seus moradores, os militantes tomaram o controle da região, beneficiando-se da hostilidade em relação a um governo que sempre pareceu distante.

No ano passado, o Exército recuperou a área numa grande ofensiva e iniciou obras públicas para reparar os danos. Os esforços começavam a dar resultado. Há um mês, os moradores faziam seus tradicionais festivais agrícolas sem temor de violência e os turistas tomaram conta dos hotéis recém-abertos.

Em 28 de julho, porém, as inundações começaram. Oficiais do Exército dizem que todas as principais pontes do Vale estão destruídas e fotografias aéreas da região mostram que os rios mudaram de direção, seguindo para o centro, onde estão os prósperos mercados de lojas. "Serão necessários meses até a eletricidade voltar", disse Rahim Dad Khan, responsável pelo planejamento no noroeste do Paquistão.

Recomeço. Segundo Khan, os planos de desenvolvimento para a região foram cancelados e o dinheiro será aplicado na reconstrução. "Pensávamos em construir hospitais e escolas. Mas está tudo perdido", disse.

Autoridades do Exército dizem saber que o Taleban vai aproveitar a situação. "Não baixaremos a guarda. As medidas de proteção seguem instaladas", disse o general Tippu Karim, que supervisiona a ajuda ao Vale e áreas do noroeste do país.

Segundo ele, a reconstrução será prioridade tão logo o Paquistão vença o desafio de socorrer os moradores ilhados e dar abrigo e comida aos desabrigados. Na agência de gerenciamento de crises da província, porém, os funcionários admitem que não possuem os recursos necessários. Mais de 15 milhões de pessoas em todo o país foram atingidas pelas inundações, segundo as estimativas oficiais.