Título: América Latina exibe sua força
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/08/2010, Economia, p. 14

Puxada por Peru e Brasil, a região mostra ambiente favorável ao avanço econômico e sinaliza para um novo boom ocidental

A despeito de instabilidades políticas localizadas, a América Latina continua firme no caminho da recuperação econômica. Atrás apenas da Ásia, puxada pelo vertiginoso crescimento da China, a região é a que mais cresce no mundo. Os países latino-americanos dão sinais concretos de que as décadas de atrofia ficaram no passado. Uma pesquisa realizada pela Fundação Getulio Vargas (FGV), em parceria com o instituto alemão Ifo, mostra que a percepção sobre as melhoras é cada vez maior. O Índice de Clima Econômico (ICE), uma espécie de termômetro do ritmo da atividade, aumentou de 5,6 para 6,0 pontos entre abril e julho, o que sugere uma fase de bonança nessa parte do mundo ocidental.

A FGV considera o resultado muito favorável, já que é o mais alto desde julho de 2007. De acordo com Lia Valls, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da FGV, o desempenho positivo está calcado na avaliação do momento atual, considerado promissor pelos especialistas consultados. O indicador de situação atual avançou de 4,7 para 5,8 pontos. A mesma expectativa que temos aqui de crescimento, bem acima dos últimos anos, também está presente em outros países, como Peru e Uruguai, observou. A melhora global do indicador na região também foi influenciada, segundo Lia, pelo peso do Brasil e do México na pesquisa.

Confiáveis No levantamento, o Brasil manteve-se no segundo lugar do ranking, ao passar de 7,0 para 7,4 pontos, superado apenas pelo Peru, onde o índice avançou de 7,1 para 7,5 pontos. O México avançou da nona para a oitava posição na lista e registrou 4,9 pontos. Na avaliação do economista-chefe do Banco Schahin, Silvio Campos Neto, os investidores dos países emergentes mudaram nos últimos anos a percepção em relação aos países latino-americanos. Não é mais uma visão homogênea. Agora, há um bloco confiável mais claro, formado por Brasil, Chile, Colômbia, Peru e México, e outro mais problemático, que inclui Venezuela e Equador, considerou.

O mercado interno forte e dinâmico, em crescimento nos países confiáveis, diz Campos Neto, é um dos fatores que chamam a atenção dos investidores estrangeiros. Entretanto, ele ressalta que cada economia mantém suas particularidades. Talvez o Chile, por exemplo, seja identificado como uma base de exportações, mas em se tratando de mercado interno, o Brasil é destaque absoluto. O Chile, após recuperar-se de um terremoto que destruiu parte do país no início do ano, registrou crescimento de 6,5% no segundo trimestre, ante 1,5% de avanço no período imediatamente anterior. No ranking da FGV/Ifo, o país manteve a quarta colocação, com 6,8 pontos.

O número 6,0 pontos Índice do Clima Econômico (ICE) da América Latina, em alta, ao voltar ao patamar de julho de 2007

Presença chinesa

O despontar da América Latina, sonho há muito acalantado entre os países que a integram, traz também seus efeitos colaterais, como a invasão dos investimentos chineses. Mais do que nunca, a região virou um porto seguro para capital e produtos exportados pelo gigante asiático. Mas o fato, que aparentemente deveria ser objeto de preocupação para os Estados Unidos, não é um problema para a maior economia mundial. Segundo o secretário de Estado adjunto que cuida dos assuntos latino-americanos, Arturo Valenzuela, o governo dos EUA não vê a presença da China uma ameaça.

De nenhuma maneira, é uma preocupação; de nenhuma maneira, é uma ameaça, declarou Valenzuela, sobre o tema, durante uma visita a Pequim. O compromisso da China, o investimento e o comércio com os países do hemisfério ocidental ajudam a fortalecer as economias e a criar empregos nesstes países, acrescentou. Segundo a autoridade americana, Estados Unidos e China têm uma coincidência de objetivos na América Latina. Segundo ele, os dois países desejam aumentar o nível de vida, melhorar a estabilidade política e fortalecer a segurança na região.

Parceria A América Latina representa 40% do comércio global dos Estados Unidos e apenas 5% do comércio exterior da China, destacou Valenzuela. No entanto, o comércio da China com a América Latina aumentou quase 10 vezes na última década, em consequência das compras chinesas de matérias-primas e das importações latino-americanas de produtos manufaturados. A despeito disso, o representante dos EUA disse em Pequim que seu país espera que a China tenha um papel ainda maior no desenvolvimento e na geração de empregos na região.

Além de expressiva relação comercial com o Brasil, a China mantém laços fortes com Cuba e Venezuela, países que enfrentam fortes dificuldades econômicas e, diferentemente dos chineses, sofrem sanções comerciais dos EUA, em razão do regime político que adotam. Segundo a autoridade de Estado americana, o desafio das nações da América Latina é crescer para conseguir superar as desigualdades internas, como os bolsões de pobreza. Nosso objetivo fundamental é garantir economias prósperas e em crescimento no Hemisfério Ocidental, e que isso beneficie todos nós, disse Valenzuela.