Título: Agressiva no exterior, China limita investimento de múlti
Autor: Pacheco, Paula
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/08/2010, Economia, p. B8

Assim como outros setores, empresas de mineraçãotambém reclamam do protecionismo chinês

A China é um dos mais agressivos investidores em mineração em outros países, mas não facilita a entrada em seu próprio território de empresas estrangeiras dispostas a buscar e explorar recursos minerais. Apesar de promessas de abertura feitas por Pequim, o segmento está entre os que recebem o menor volume de investimentos externos e continua bastante protegido pelo governo.

Entidades que representam multinacionais do setor se juntaram no ano passado à cada vez mais extensa lista de investidores que se consideram prejudicados pelo que classificam como protecionismo chinês contra empresas de capital estrangeiro.

De maneira geral, elas se queixam de barreiras à entrada de investimentos em determinados setores e de medidas que beneficiam companhias chinesas na concorrência com as que possuem capital estrangeiro.

O Brasil possui uma regulamentação extremamente favorável ao investimento externo, comparável à dos países ricos que integram a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A legislação dá o mesmo tratamento a empresas de capital nacional ou estrangeiro, desde que sejam constituídas no País.

Poder. Com uma população de 1,3 bilhão de pessoas e um mercado consumidor de promessas infindáveis, a China tem o poder de impor às empresas estrangeiras condições que dificilmente aceitariam em outros países.

No setor automobilístico, por exemplo, todas as grandes fabricantes americanas, europeias, japonesas e coreanas são obrigadas a manter joint-ventures com estatais chinesas. Não é segredo que Pequim quer construir suas próprias grandes montadoras e a associação compulsória com os estrangeiros é uma forma de absorver tecnologia.

A expectativa dos investidores era a de que as restrições diminuiriam com o tempo e o mercado chinês se tornaria cada vez mais aberto ao capital externo produtivo. Mas em alguns setores ocorreu o contrário.

Empresas como a alemã Siemens e a francesa Alstom investiram no setor ferroviário na China só para não serem excluídas de grande parte do ambicioso projeto de expansão da rede de trens rápidos do país, que prevê a conclusão de 13 mil km de linhas.

Agora, começam a enfrentar a concorrência em terceiros mercados dos fabricantes chineses, que desenvolveram sua tecnologia com a "absorção" do know-how de empresas estrangeiras.

A entidade China International Mining Group, mantida por gigantes como Anglo American e Rio Tinto, divulgou documento em 2009 no qual afirma que a China abandonou em anos recentes a abertura aos investimentos estrangeiros que existiu no setor de mineração entre 2004 e 2006.

"Na medida em que nos aproximamos de 2010, muitos desses investimentos não se realizaram e alguns foram suspensos ou totalmente abandonados. Isso levou a um sentimento de incerteza entre algumas companhias do setor e seus acionistas em relação à China como destino de investimentos em metais, exploração e mineração", dizia o texto.

Mercado interno. O poder de atração do mercado interno como arma de Pequim para impor suas condições às empresas estrangeiras fica evidente em uma passagem do livro The Party - The Secret World of China´s Communist Rulers, escrito pelo ex-chefe do escritório do Financial Times em Pequim, Richard McGregor.

A cena se passa em maio de 2009, durante encontro entre o poderoso vice-primeiro-ministro Wang Qishan e a comissária da União Europeia para o Comércio, Catherine Ashton, que estava acompanhada de executivos de grandes empresas do continente. Como se tornou cada vez mais frequente desde a eclosão da crise global em 2008, eles se queixaram de barreiras para o acesso ao mercado chinês.

Em resposta, Wang reconheceu que existiam "irregularidades", mas o charme do mercado chinês era irresistível. "Em outras palavras, de acordo com executivos presentes ao encontro que ficaram atônitos com o vice-primeiro-ministro, quaisquer que sejam as suas reclamações, o mercado é tão grande que vocês virão de qualquer maneira", escreveu McGregor.