Título: 'A inflação está muito próxima da meta. Não havia motivos para subir a taxa'
Autor: Fernando Nakagawa
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/09/2010, Economia, p. B6

O Estado de S.Paulo

ENTREVISTA José Júlio Senna, ex-diretor do Banco Central

Para o ex-diretor do Banco Central José Júlio Senna, o ciclo de alta da taxa de juros em 2010 terminou. A taxa só voltaria a subir em 2011, se a situação da economia americana se deteriore e o Brasil voltar a crescer. A decisão foi acertada? Sim. A inflação projetada pelos modelos convencionais está muito próxima da meta de 4,5% para 2011. Não havia motivos para subir a taxa. Além disso, não está nada fácil interpretar corretamente os sinais contidos nas últimas estatísticas. Que sinais são esses? A desaceleração econômica é clara, mas ainda há muito ruído nos dados. Por exemplo, do primeiro para o segundo trimestres, houve estagnação ou queda nas vendas reais do comércio, devido à retirada dos estímulos fiscais para compra de bens duráveis. Teria ocorrido uma antecipação de consumo em março, mas não se sabe quanto haverá de recuperação. Outro exemplo é o da inflação, que veio a zero em junho e julho e será baixinha em agosto. Mas esse é um fenômeno transitório. No fim do ano, ela estará novamente em 0,4% ou 0,5% ao mês. Do lado da produção, houve queda em junho, por causa da Copa, que reduziu substancialmente as horas trabalhadas. Porém, não se sabe quanto da desaceleração no fim do segundo semestre se deveu a fatores que não mais se repetirão. A produção de julho (alta de 0,4%) foi bastante modesta.

E o cenário externo?

Surgiram sinais de que a economia americana parou de se recuperar e passou a crescer em ritmo inferior ao seu potencial. Quando isso acontece, a capacidade ociosa e o desemprego não desaparecem. A persistir esse quadro, teríamos daqui para a frente efeitos externos favoráveis sobre o Brasil, por meio de melhor comportamento da chamada inflação importada.

Quais são as perspectivas?

Parece certo que voltaremos a ter crescimento próximo do potencial, de 4,5% ao ano, bem melhor que os prováveis 2,5% do segundo trimestre. Se isso se confirmar e a situação lá fora não ficar tão feia quanto parece, o juro voltará a subir, cerca de 150 pontos, mas em 2011.

E se não crescermos tanto e a situação americana piorar?

Nesse caso, o ciclo de alta terá sido definitivamente encerrado. Não é o cenário mais provável, mas a sua probabilidade é crescente.

Por que é crescente?

O grande temor é que a munição fiscal e monetária para reanimar a economia americana esteja chegando ao fim.