Título: Teerã suspende pena de Sakineh por adultério
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/09/2010, Internacional, p. A14

Acusação de cumplicidade na morte do marido, porém, segue vigente; defesa denuncia ""jogada política"" O Ministério das Relações Exteriores do Irã anunciou ontem, em Teerã, a suspensão da pena de morte imposta à Sakineh Ashtiani pela acusação de adultério, mas acrescentou que a iraniana de 43 anos segue como ré no processo que investiga sua participado no assassinato do marido. Diante do aumento da pressão internacional, o governo iraniano esclareceu que a sentença pelo adultério está sob revisão e um novo veredicto "definitivo" deve ser anunciado nos próximos dias. Em Paris, militantes de direitos humanos veem na medida uma jogada política.

De acordo com o porta-voz da chancelaria, Ramin Mehmanparast, "o veredicto sobre o caso extraconjugal foi suspenso e está em curso de reexame". Para ele, a condenação de Sakineh é um caso de Justiça, e não de direitos humanos. "Se a libertação de todos aqueles que cometem um assassinato fosse interpretada como um caso de direitos humanos, então todos os países europeus deveriam libertar os assassinos em seus territórios."

A suspensão da pena foi confirmada por Vahid Kazembadeh, coordenador da Comissão Islâmica de Direitos Humanos, órgão ligado à Justiça iraniana.

Em entrevista à agência oficial Fars, Kazembadeh afirmou que a sentença foi "suspensa por ordem do chefe da autoridade judicial" e não será aplicada "por enquanto". O coordenador assegurou ainda que Sakineh não foi condenada a mais 99 chibatadas na semana passada, como seus parentes haviam informado.

Repercussão. Na Europa, onde intelectuais e militantes de organizações de direitos humanos lançaram um movimento pela libertação da condenada, as declarações do governo iraniano foram interpretadas como uma "jogada política".

Segundo Armin Arefi, coordenador da campanha, a suspensão seria a mesma anunciada em 11 de julho pelo governo. "É uma informação falsa, pois a pena já estava suspensa. Não há nenhuma mudança no caso, pelo contrário: a suspensão pode ser anulada a qualquer momento com o fim do Ramadã", afirmou Arefi ao Estado ontem, em Paris.

Ele obtém informações do advogado iraniano de Sakineh, Houtan Kian, que se mantém em contato com os líderes do movimento na Europa.

PARA ENTENDER

Em 2006, Sakineh Mohammad Ashtiani foi condenada a 99 chibatadas por ter tido "relações ilícitas" com dois homens, um deles sentenciado à morte pelo assassinato do marido dela. Seu processo foi reaberto e ela foi condenada à morte por apedrejamento pela acusação de adultério e a 10 anos de prisão por cumplicidade na morte do marido.

O governo do Brasil chegou a oferecer asilo a Sakineh - oferta rejeitada por Teerã. A chancelaria iraniana afirma que outros países não deveriam interferir no caso e sustenta que a condenação não é uma questão de direitos humanos, mas uma punição determinada pela Justiça. Tanto a ré quanto o advogado dela, Mohammad Mostafaei - asilado na Noruega -, alertam que Teerã acrescentou a acusação de homicídio para justificar a execução.