Título: Obama enfrenta desafio de seduzir eleitores cansados de guerra e crise
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/08/2010, Internacional, p. A18

Teste nas urnas. Pressionado pela perda de mais de 5 mil soldados e pelo rombo fiscal causado por dois conflitos impopulares, presidente dos EUA tenta aumentar as chances de seu partido cumprindo uma de suas mais importantes promessas de campanha

Além dos 14,6 milhões de desempregados e do gigantesco rombo fiscal, o governo do presidente dos EUA, Barack Obama, enfrenta outro inimigo interno nas eleições de novembro: as guerras. A retirada apressada das tropas de combate americanas do Iraque, na semana passada, e a insistência da Casa Branca em manter o cronograma de saída do Afeganistão, em julho de 2011, são expressões do quanto os eleitores americanos estão cansados de perdas humanas e do desperdício de dinheiro público.

As eleições de 2 de novembro, no meio do mandato presidencial, terão o efeito de referendo sobre a governo do presidente. Como resultado prático, contudo, podem condenar Obama a seus dois últimos anos de mandato sem o atual conforto d a maioria no Congresso e emperrar projetos importantes, como a reforma da educação, do setor de energia e das leis de imigração.

A votação renovará todas as cadeiras da Câmara dos Representantes (435 deputados) e cerca de um terço do Senado (36 das 100 vagas de senadores), além de definir governadores em 37 dos 50 Estados americanos e de dois territórios da federação.

Pesquisa do Instituto Gallup, realizada entre os dias 27 de julho e 1.º de agosto, indicou que 53% dos americanos reprovam a forma como o presidente vem conduzindo a guerra do Iraque. Nesse período, ele já havia determinado a retirada das tropas de combate do país até o fim de agosto.

No caso da guerra do Afeganistão, a reprovação é ainda maior: 57%. Porcentuais superiores foram encontrados em outros três temas que também minam as chances do Partido Democrata, de Obama, na votação de novembro: a economia estagnada (crítica de 59% dos americanos), o déficit público de US$ 13,3 trilhões (preocupação de 64% dos eleitores) e a ausência de uma política nacional de imigração (queixa de 62% dos entrevistados).

Pelo menos um desses três problemas, o enorme rombo fiscal, é relacionado diretamente pelo eleitorado às duas guerras. Os gastos do governo com a área de Defesa, especialmente nas frentes de batalha no Iraque e no Afeganistão, chegarão a US$ 750 bilhões este ano.

Entretanto, pior ainda é o custo de 4.416 jovens americanos mortos no Iraque e outros 1.234 nos campos afegãos. As vítimas de guerra são um peso para os EUA e uma questão que Obama prometeu resolver, ainda durante a campanha eleitoral, em 2008, mas não conseguiu.

A retirada das forças de combate do Iraque, concluída em uma silenciosa operação no dia 15, evidenciou a preocupação da Casa Branca com o impacto da guerra nas eleições de novembro. Mesmo correndo o risco de ser cobrado no futuro e acusado de ter abandonado o Iraque a sua própria sorte, Obama não se deixou abalar pelos recentes ataques suicidas em Bagdá e permitiu que a saída dos soldados ocorresse duas semanas antes de esgotar o prazo final, no dia 31.

"O governo Obama tomou todo o cuidado para que não se repetissem os desastres das retiradas das tropas soviéticas do Afeganistão, em 1988, e dos soldados americanos do Vietnã, em 1975", afirmou David Mark, editor executivo do Politico, principal site de informação e de análise de política dos EUA.

"Além do compromisso do presidente Obama de retirar os soldados americanos do Iraque, a esquerda do Partido Democrata o pressionava fortemente para que o governo acabasse com essa missão, classificada por eles como imperial", disse Mark.

De acordo com a pesquisa do Gallup, 78% dos democratas concordam que a guerra no Iraque foi um "erro". Entre os consultados, 68% querem que a retirada dos 50 mil soldados americanos remanescentes ocorra, no máximo, até dezembro de 2011, como está programado, independentemente da situação no campo de batalha.

Para Mark, a retirada dos militares americanos do Iraque certamente deixará os iraquianos expostos a uma maior influência do Irã em seu governo e a eventuais disputas pelo território curdo, no norte do país.

"A questão fundamental é saber se o Parlamento iraquiano funcionará ou se permitirá a ascensão de um novo Saddam Hussein", afirmou Mark, referindo-se ao ditador iraquiano derrubado, caçado pelas forças americanas, condenado pela Justiça iraquiana e enforcado em 2006.