Título: Meta será cumprida com antecipação de receitas
Autor: Fernandes, Adriana ; Graner , Fabio
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/09/2010, Economia, p. B1

O governo montou nos últimos meses uma complexa engenharia financeira para permitir a troca de ativos entre estatais e bancos públicos e garantir o melhor desempenho da União na capitalização da Petrobrás. Além disso, a capitalização dará reforço extra ao caixa do governo e tudo indica que o compromisso assumido no início do ano pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e pelo secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, de fazer integralmente a meta de 3,3% de superávit primário das contas do setor público será cumprido. Fica mais fácil agora entender por que, mesmo com a desconfiança dos analistas do mercado, o ministro Mantega e, sobretudo, o secretário Augustin vêm insistindo que a meta será cumprida.

A chamada meta "cheia" poderá ser feita sem a necessidade de usar o recurso previsto na política fiscal, que permite o abatimento das despesas investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), mas a qualidade do superávit será questionada. O governo lança mão de mais um expediente de aumento de receitas, que pode ser caracterizado como heterodoxo, e torna discutível a relevância da meta de superávit primário.

Afinal, para que serve uma meta que sinaliza um compromisso de contenção de despesas, se o governo usa mecanismos para antecipar receitas que numa situação normal não entrariam no caixa? O governo fará um resultado maior não porque agiu com mais austeridade em seus gastos, mas porque conseguiu inflar as receitas que só entrariam no caixa mais adiante, como a venda de R$ 1,4 bilhão de dividendos ao BNDES que a União tem a receber da Eletrobrás. Uma receita que, na prática, não pertence a esse governo. Além de pôr em xeque a política fiscal, essa forma de atuar faz com que os ministérios não tenham constrangimento em pressionar a área econômica para gastar, o que dificulta o discurso de Augustin de que vai cortar gastos.