Título: Ameaça de Mantega segura o câmbio, mas País enfrenta 'chuva' de dólares
Autor: Modé , Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/09/2010, Economia, p. B1

Ao menos por um dia, o governo conseguiu frear a alta do real no "gogó". O dólar ganhou ontem 1,11%, para R$ 1,726, depois de atingir, terça-feira, o menor valor em 10 meses. Em duas ocasiões ao longo do dia, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o governo fará tudo o que puder para impedir a valorização excessiva do real - nos últimos 4 dias, entraram mais de US$ 2 bilhões no País.

O mercado especula, agora, o que pode ser feito. "Tomaremos as medidas adequadas para que o real não seja valorizado", afirmou Mantega no início da tarde. "Vamos enxugar qualquer excesso de dólar que possa entrar com a operação da Petrobrás. Vamos comprar tudo, já estou avisando", reforçou um pouco mais tarde, referindo-se à informação, antecipada pelo Estado sábado, de que o Banco Central (BC) vai comprar todos os dólares que entrarem no Brasil em decorrência da capitalização da Petrobrás.

O problema é que não é apenas essa operação que tem provocado a valorização recente do real. O dólar tem caído ante praticamente todas as moedas do mundo - em grande medida por causa da fraqueza da economia dos Estados Unidos. Nos últimos 30 dias, o dólar australiano ganhou 5,2% ante o americano, a coroa sueca, 5,17% e o franco suíço, 4,79%. O real subiu 2,66%.

Ontem, por exemplo, o Banco do Japão interveio no mercado de câmbio pela primeira vez em seis anos. O BoJ comprou perto de US$ 12 bilhões. Não é muito, levando-se em conta que o mercado cambial do país movimenta mais de US$ 500 bilhões por dia. Mas sinaliza uma nova tendência. Por trás das ações dos governos, está a intenção de conter a baixa das exportações, sobretudo de manufaturados.

A grande questão que se coloca, a partir de agora, é o que o governo brasileiro fará para garantir que as palavras de Mantega se tornem ações concretas.

Um analista afirma que, se o governo quiser, tem "bala" para lutar contra a forte aposta do mercado na valorização da moeda brasileira. Para isso, argumenta, teria, entre outras coisas, de aumentar as intervenções diárias no mercado cambial.

Outros especialistas argumentam que há pouco a fazer. O Brasil tem superávit comercial (principalmente por causa das exportações de commodities), a maior taxa de juros do mundo (que atrai capital especulativo), fará a operação da Petrobrás até o fim deste mês (que pode representar ingresso de até US$ 20 bilhões, segundo estimativas) e o dólar cai no mundo todo.

Nos últimos dias, dados das reservas cambiais indicam que o BC acelerou a compra de dólares - US$ 2,8 bilhões de sexta a terça-feira. Ainda assim, no mercado futuro, investidores estrangeiros apostam US$ 12 bilhões no real. E os bancos, US$ 14 bilhões.

Além disso, o ingresso de moeda americana cresceu na semana passada. Em quatro dias, o fluxo cambial (entrada menos saída) foi positivo em US$ 2,43 bilhões, média de US$ 608,4 milhões/dia. Na semana anterior, a média foi negativa em US$ 241,7 milhões.

Uma das atitudes mais especuladas pelos profissionais do mercado é a volta do swap reverso, um tipo de operação de mercado futuro que, na prática, equivale à compra de dólar. O BC abandonou o instrumento no auge da crise global, em 2008. A autoridade monetária não comentou a possibilidade. / COLABORARAM ALESSANDRA SARAIVA, FÁBIO GRANER e JACQUELINE FARID