Título: MEC revisa graduações e reduz variedade de cursos de Engenharia
Autor: Mandelli, Mariana ; Primi, Lilian
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/09/2010, Vida, p. A18

Revisão dos cursos de graduação feita pelo Ministério da Educação (MEC) reduzirá a variedade dos cursos de Engenharia oferecidos pelas universidades e faculdades do País. Atualmente há mais de 200 nomes diferentes de cursos, alguns bastante especializados, como Engenharia de Automação Empresarial e Engenharia de Petróleo e Gás. O processo de revisão está em andamento e, por enquanto, o número de cursos caiu para 53.

A mudança está provocando polêmica entre o ministério, especialistas e representantes de instituições de ensino superior, que afirmam não terem sido consultados. Eles acusam o ministério de querer engessar o mercado. "Concordamos que há um exagero no número de cursos criados e muitos realmente não justificam ter um novo nome, mas a forma como isso aconteceu está errada", diz o presidente da Associação Brasileira de Educação em Engenharia (Abenge), João Sérgio Cordeiro.

Cordeiro diz que os avanços tecnológicos, cada vez mais rápidos, criam novas profissões e exigem a abertura de cursos. "As universidades precisam ter agilidade para acompanhar essa evolução. Além disso, há casos em que a diferenciação é necessária e isso não foi considerado, e outros ainda em que a intervenção fere a legislação. Quem fez esse trabalho não entende do mercado", completa.

Responsável pela Secretaria de Ensino Superior do MEC (Sesu), Maria Paula Dallari Bucci contesta a afirmação. "Eles estão desatualizados. Houve uma consulta pública e dela tiramos uma lista que foi usada como subsídio para o cadastro do e-MEC", rebate. O e-MEC é um sistema eletrônico de cadastramento dos cursos que foi implementado em 2007 e é, atualmente, o único acesso para cadastros dos cursos de graduação no País.

A lista de engenharias que está hoje no e-MEC conta com 53 tipos diferentes de cursos. Constam no cadastro, considerando todas as instituições do Brasil, 1,3 mil cursos de Engenharia.

Segundo Maria Paula, a mudança facilitará também a avaliação dos cursos. "Muitas instituições usam um nome novo para fugir do Enade e escapar da avaliação." O Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) avalia o rendimento dos alunos de cursos de graduação.

O reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e vice-presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Alvaro Prata, concorda. "A revisão é necessária. Precisamos padronizar e ter uma referência. Muitas instituições privadas têm usado esse artifício para evitar um comprometimento com o sistema de avaliações", afirma. "Desse jeito, não há como averiguar a qualificação desses cursos."

Mas, por outro lado, as universidades devem ter asssegurado o direito de inovar, argumenta Prata. "Qual engenharia queremos para o futuro? É essencial que as instituições reconhecidas não percam a capacidade de inovação, pois elas precisam agregar os valores da modernidade."

Organização e concorrência. Com a revisão dos nomes, o objetivo do governo é unificar a base de dados do e-MEC. A secretária do MEC diz que a unificação manterá a consistência dos cursos e limitará aventuras inconsequentes. "A instituição que não concordar com a exclusão do nome pode enviar uma contestação com uma justificativa para o uso de um novo nome. Se for consistente, aprovamos o novo nome", explica. O cadastro atual do e-MEC lista as denominações já consolidadas. "As atualizações serão constantes a partir de agora."

Especialistas em ensino superior dividem opiniões sobre a reformulação. Para o consultor educacional Ryon Braga, a ideia do MEC é positiva. "O Brasil está na contramão em relação ao resto do mundo. No exterior, as graduações são generalistas, com tempo mais curto, não chegam a esse nível de profundidade. Temos uma cultura errada de um bacharelado que é muito especializado", opina. "A revisão vai facilitar a vida dos estudantes e vestibulandos."

Já o consultor Carlos Monteiro pensa que a padronização vai minar a concorrência de mercado. "Se os nomes, currículos e laboratórios forem iguais, qual será o diferencial de um curso para o outro?", questiona. "Vai facilitar a vida do MEC e complicar a das instituições."

Posição semelhante tem o Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp). "Criar um catálogo de cursos, como o MEC fez com os cursos tecnológicos, é engessar o mercado", defende José Roberto Covac, do departamento jurídico do Semesp. "Isso fere a autonomia das universidades e restringe a criatividade das instituições."

PARA LEMBRAR Brasil sofre com escassez de engenheiros

Um levantamento feito pelo Estado revelou que, entre os 589 cursos autorizados pelo Ministério da Educação entre julho de 2008 e agosto de 2009, apenas 13% eram de Engenharia. Nem mesmo as novas universidades públicas colaboraram muito para o crescimento das vagas: entre os 283 cursos que estão sendo ofertados pelas 12 novas federais, apenas 52 são de Engenharia. Falta de profissionais para ensinar e o alto custo da criação de laboratórios inibe instituições privadas, que preferem se dedicar a áreas mais simples, como Pedagogia, Administração ou Direito. Desde 2002, o número de vagas disponíveis em cursos de Engenharia cresceu 40%. Parece muito, mas o patamar de partida era baixo. Em 1991, enquanto Direito já tinha 35 mil vagas nos vestibulares, Engenharia mal passava de 5 mil. Hoje, todos os cursos de Engenharia no País somam pouco menos de 120 mil vagas, excluindo os tecnólogos.

GLOSSÁRIO

Credenciamento Para iniciar as atividades, as instituições devem solicitar credenciamento ao MEC, feito a partir da análise documental e avaliação in loco.

Recredenciamento Ao final de cada avaliação do Inep, as instituições devem solicitar a renovação do credenciamento junto ao MEC.

Autorização de abertura de cursos Universidades e centros universitários são instituições autônomas e não precisam de autorização para abrir cursos (exceto de Medicina, Odontologia, Psicologia e Direito). As faculdades têm de requerer autorização.

Reconhecimento Quando a primeira turma do curso faz de 50% a 75% da carga horária, a instituição deve pedir o reconhecimento.