Título: Fuvest tem maior número de inscritos da rede particular dos últimos 10 anos
Autor: Lordelo, Carlos
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/09/2010, Vida, p. A33

Educação. Dados divulgados ontem pela Universidade de São Paulo (USP) mostram que candidatos que cursaram o ensino médio em escolas privadas representam 65,7% das inscrições. Porcentual de estudantes da rede pública permanece estável, em 28%

A atual edição da Fuvest registrou o maior número de candidatos vindos da rede particular dos últimos dez anos. Do total de 132.969 interessados em conquistar uma vaga na Universidade de São Paulo (USP), 65,7% são egressos de colégios privados. O levantamento foi feito pelo Estado a partir de dados sobre o processo seletivo divulgados ontem.

Em termos absolutos, são 87.407 candidatos oriundos de escolas particulares. Ex-alunos da rede pública municipal, estadual e federal somam 37.725 inscritos - 28,4% do total. O número inclui os treineiros, estudantes que ainda não concluíram o ensino médio e querem testar suas habilidades. "O total de candidatos poderá sofrer ainda leves alterações nos próximos dias, após a solução de algumas pendências bancárias ligadas à inscrição", afirma a Fuvest.

A USP tem tentado ampliar o acesso e a permanência de estudantes de escolas públicas em suas unidades. Para isso, lançou em 2007 o Programa de Inclusão Social da USP (Inclusp), que prevê bônus de até 12% na nota desses candidatos, além de oferecer isenção da taxa de inscrição.

No entanto, a pesquisa feita pela reportagem mostra que, desde a adoção do programa, caiu vertiginosamente a procura de formados na rede pública pelo benefício concedido pela universidade. Neste ano são 34.155 (25,7%) os candidatos que se inscreveram no Inclusp, enquanto que em 2007 foram 52.047 - 36,5% do total dos 142.656 concorrentes.

"Engenharia reversa." Para o consultor Carlos Monteiro, existe na educação brasileira uma "engenharia reversa", em que alunos egressos de escolas públicas fazem faculdades particulares, enquanto que os formados na rede privada dominam as instituições públicas.

"Isso acontece na USP, que é uma ilha de excelência. A maioria dos estudantes de escola pública sabe que não tem condições de competir em um vestibular tão concorrido como o da Fuvest, mesmo com os programas de bonificação", afirma.

Na opinião de Ocimar Alavarse, professor da Faculdade de Educação da USP, o Inclusp é "tímido demais" e "precisa ser melhor divulgado". O desinteresse de alunos de escola pública pela USP, segundo ele, pode ser fruto de duas variáveis. "Eles analisam a probabilidade de passar no vestibular como baixa e, ao mesmo tempo, consideram a chance de fazer uma faculdade particular custeada por uma bolsa do ProUni (Programa Universidade para Todos, do governo federal)."

Frei David dos Santos, da entidade Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro), vai além. "O Inclusp é uma enganação e os alunos de escola pública viram isso. Por isso eles nem se inscrevem mais na Fuvest e preferem o ProUni."

Segundo o presidente da rede de cursinhos comunitários Henfil, Mateus Prado, a cada ano que passa a USP se distancia mais da sociedade. "A quantidade de vagas oferecidas é baixa e é difícil para um aluno de escola pública conseguir passar dos 40% de aproveitamento nas provas", diz. "Ganhar até 12% em cima de uma nota baixa não significa muito. O Inclusp é um programa para inglês ver."

Prado também reclama da divulgação do benefício neste ano e vê contradição no fato de a USP querer fechar cursos com pouca demanda, como os da unidade Leste, e, ao mesmo tempo, estimular a participação de egressos da escola pública. "Quem pelo menos tentava a USP já não tenta mais. Vai logo para uma particular para conseguir o que quer, um emprego rápido."

Medidas. A pró-reitora de graduação da USP, Telma Zorn, contesta os dados e diz que dobrou o número de inscritos na edição deste ano do Programa de Avaliação Seriada (Pasusp), prova que faz parte do Inclusp e é aplicada para a rede pública com objetivo de dar bônus de até 3% na pontuação da Fuvest.

Ao mesmo tempo, admite Telma, é preciso melhorar a divulgação da própria USP entre os alunos de escolas públicas, que desconhecem a instituição. "Muitos pensam que a universidade é paga. Vamos fazer um vídeo institucional para mostrar que eles devem, sim, se inscrever no vestibular, porque a USP é gratuita e de qualidade."