Título: Chefe da polícia equatoriana renuncia e Correa promete punição a rebeldes
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Fonte: O Estado de São Paulo, 02/10/2010, Internacinal, p. A33

Presidente afirma que vai promover "limpeza" nos quartéis e não haverá perdão para conspiradores; cinco pessoas morreram nos confrontos no país. Exército nega demora para intervir na crise e diz que planejou ação de resgate para evitar banho de sangue Ariel Palacios "Não haverá perdão nem esquecimento." Com essas palavras, pronunciadas na madrugada de ontem, em rede nacional de TV, o presidente Rafael Correa deixou claro que fará uma "profunda limpeza" nos setores da polícia e da Aeronáutica que se rebelaram na quinta-feira nas principais cidades do país em protesto contra cortes salariais e perda de diversos privilégios.

O motim, segundo a oposição - ou a "tentativa de golpe", segundo o governo -, terminou em menos de 24 horas com o saldo de 8 mortos e 274 feridos. Longe de um discurso conciliador, o presidente equatoriano, que define a si próprio como "cristão de esquerda", afirmou que todos os envolvidos serão "punidos devidamente" e denunciou a existência de "muitos infiltrados de partidos políticos bem conhecidos". Correa sustenta que a rebelião "não foi uma sublevação por recomposição salarial, foi uma conspiração".

Ontem, quando Quito voltava à normalidade após os tiroteios e saques aos comércios da véspera, começaram a ser sentidos os primeiros sinais da caça às bruxas. A depuração começou com Freddy Martínez, comandante da Polícia Nacional, que apresentou sua renúncia após fracassar em sufocar a rebelião da força que comandava.

"Com certeza, Correa fará uma grande depuração", disse a socióloga Bertha García ao Estado. Diretora do Programa Democracia, Segurança e Defesa vinculado à Pontifícia Universidade Católica de Quito. Segundo Bertha, "foi um motim, mais do que um golpe. E não descarto a possibilidade de a situação se repetir em médio ou longo prazo".

Ela ressalta que a rebelião foi singular, já que a polícia, historicamente, não havia protagonizado motins ou golpes contra um presidente.

Demora. A especialista acredita que os militares demoraram para agir durante a crise equatoriana. "Parecia que os soldados estavam observando o cenário antes da intervenção."

O tenente-coronel Jorge Villalba, diretor de Comunicação Social do Comando Conjunto das Forças Armadas, indicou que aquilo que pareceu "demora" foi na verdade "o planejamento de uma ação de resgate precisa, que implicasse no mínimo de sangue derramado". Villalba destacou que as Forças Armadas respeitam a Constituição e país voltava ontem "à normalidade".

Diplomatas de dois países da União de Nações Sul-americanos (Unasul) e um da União Europeia disseram que a "entrada em ação do Exército demorou muito". Durante esse lapso, diversos setores políticos ficaram em "stand-by, na expectativa de um cenário favorável à uma eventual saída de Correa do poder". Os diplomatas destacaram que o incidente não teve características dos golpes da região e Correa saiu "com muito mais força".

A secretária americana de Estado, Hillary Clinton, telefonou ontem a Correa para manifestar seu apoio e desejar a rápida e pacífica restauração da ordem.