Título: O otimismo do BC poderá não se verificar no tempo
Autor: Graner, Fabio ; Fernando Nakagawa
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/10/2010, Economia, p. B1

O Banco Central (BC) decidiu ser otimista, de qualquer maneira, na sua visão prospectiva da inflação, em nome da sua pesquisa da taxa de juro real, à qual se referiu na última Ata do Copom. O seu Relatório de Inflação analisa com cuidado o ambiente econômico interno, partindo de duas hipóteses básicas: manutenção da taxa Selic em 10,76% (que o BC considera compatível com uma taxa de juro real de equilíbrio); e uma taxa cambial de R$ 1,75 por dólar. No caso da Selic, o relatório explica que não se trata de um compromisso, mas que as autoridades monetárias sempre estarão prontas para revê-la caso a inflação mude de rumo. Já a taxa cambial se torna mais aleatória, especialmente depois de o presidente do Banco Central ter admitido aumentar o IOF sobre o ingresso de capitais.

O mais interessante é a visão da conjuntura com que o BC justifica seu otimismo em relação à evolução da inflação, que nos próximos meses continuaria próxima da meta central. Seria necessário, aqui, lembrar que uma meta de inflação de 4,5% não é uma escolha pacífica num contexto internacional em que as metas são mais modestas. Mas o relatório reúne alguns fatos para sustentar suas análises.

Com certa razão, admite uma recuperação econômica muito lenta dos países do Primeiro Mundo, e um crescimento de 7,4% do PIB brasileiro neste ano. Resultado que será fruto de uma demanda doméstica robusta, de uma demanda pública também forte e com a indústria - que hoje está investindo - acompanhando bem a demanda. O que evita o risco inflacionário.

O crescimento da demanda doméstica tem origem no crescimento do emprego acompanhado pelo aumento da renda. Neste ponto, o BC não pode deixar de se referir ao problema dos reajustes salariais excessivos, lembrando que "moderação salarial constitui elemento-chave para a obtenção de um ambiente com estabilidade de preços".

O relatório considera que a política fiscal não representa problema, graças a uma arrecadação (que ele não discute) que permite obter o superávit primário previsto (sem se referir aos truques usados para isso).

Finalmente, não parece se preocupar com o déficit crescente das transações correntes do balanço de pagamentos, criado por uma taxa cambial supervalorizada cuja correção pode dar sério impulso à inflação e impedir importações que até agora permitem manter a inflação sob um controle relativo, porém muito frágil. Naturalmente, não houve referência a qualquer risco político.