Título: BC exporta tecnologia de reserva para a crise
Autor: Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/10/2010, Economia, p. B7

Autoridade monetária responde a questões de estrangeiros sobre depósito compulsório

Bancos centrais do mundo inteiro estão interessados em entender como funciona uma invenção brasileira: os imensos depósitos que bancos privados são obrigados a fazer no Banco Central, os chamados compulsórios.

Celso Junior/AE "Aula" Meirelles participou de reunião em Bruxelas, onde falou sobre de´pósitos compulsórios

A área técnica do BC responde de cinco a seis questionamentos sobre o assunto por semana, desde que os comandantes do sistema financeiro mundial, reunidos no chamado comitê de Basileia, elaboraram uma proposta de normas adicionais de segurança para o sistema financeiro, batizada de Basileia 3. Discute-se um mecanismo semelhante ao compulsório nacional.

"Existe uma tecnologia brasileira de combate aos efeitos da crise", disse ao Estado o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. "Ela chamou a atenção, principalmente depois que deu certo."

As condições da entrevista demonstram o sucesso das técnicas aplicadas no País: ela foi concedida por telefone, de Bruxelas, onde o Brasil era o único país de fora da Europa convidado para uma reunião de presidentes de bancos centrais, ministros de Fazenda, banqueiros e empresários. O assunto era regulamentação financeira.

As normas de Basileia 3 ainda estão em análise e dependem da aprovação dos presidentes das principais economias do mundo, o chamado G-20, para entrar em vigor. O grupo vai se reunir em novembro, em Seul.

Diferentemente dos bancos estrangeiros, os brasileiros não podem emprestar todo o dinheiro que recebem de seus clientes na forma de depósitos ou aplicações. Boa parte fica compulsoriamente guardada no BC. Atualmente, a reserva corresponde a 43% dos depósitos à vista (conta corrente), 15% dos depósitos a prazo (aplicações) e 20% da poupança. Esse grau de exigência é objeto de crítica no País.

Quando estourou a crise, no final de 2008, o sistema pelo qual os bancos emprestam dinheiro entre si e mantêm as engrenagens girando entrou em colapso. O crédito desapareceu e muitos bancos se viram sem ter de onde tirar recursos.

Caixa rápido. No Brasil, as instituições financeiras foram autorizadas a sacar parte do compulsório. No total, foram liberados R$ 99,8 bilhões, dos quais cerca de R$ 41 bilhões foram direcionados aos bancos de médio porte, que sentiram mais duramente o sumiço do crédito.

Em Basileia 3, uma das recomendações é que aumentem suas reservas de liquidez, o que pode ser feito em dinheiro, ações de empresas de primeira linha ou títulos públicos. "Evidentemente, o compulsório é o papel mais líquido, porque é emitido pela autoridade monetária", disse Meirelles. Ele explicou que não necessariamente os países adotarão as regras brasileiras. Poderão escolher outras formas de efeito semelhante.

Na avaliação de Meirelles, a liberação de parte dos depósitos compulsórios ajudou a baratear o custo do combate à crise. Isso porque a medida ajudou principalmente os bancos de médio porte, entre eles os de montadoras, que por algum tempo não tiveram como conceder financiamento de veículos. As operações foram retomadas quando o dinheiro do compulsório "irrigou" o sistema. Isso, combinado com a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), restaurou rapidamente o mercado de automóveis.

Brasil como referência A informatização da Receita Federal também foi alvo do interesse estrangeiro. "Bill Gates escreveu um artigo elogiando o Brasil", lembra Everardo Maciel, secretário da Receita do governo FHC.