Título: Alta do IOF faz real se valorizar menos que outras moedas
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/11/2010, Economia, p. B1

Elevação das alíquotas do imposto consegue neutralizar efeitos da enxurrada de dólares dos Estados Unidos na economia mundial

Graças à elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o governo federal conseguiu neutralizar, por enquanto, os efeitos sobre a taxa de câmbio da enxurrada de dólares jogada pelos Estados Unidos na economia mundial. O real se valorizou bem menos que outras moedas e descolou dos preços das commodities.

Ontem, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) anunciou que vai comprar US$ 600 bilhões em títulos de longo prazo do governo americano para reativar a economia. Como a medida já era esperada desde o dia 21 de setembro, quando ocorreu a reunião anterior do Fed, os mercados reagiram com calma.

O dólar fechou ontem a R$ 1,6990 no mercado de baldio, uma queda de 0,47% em relação ao dia anterior, testando o nível de R$ 1,70 pela primeira vez em sete sessões. No entanto, desde que começaram as especulações sobre as medidas do Fed há seis semanas, o real acumula alta de apenas 1% em relação a moeda americana.

A perspectiva de novas medidas do Fed provocou uma desvalorização do dólar e elevou os preços das commodities nesse período. Em relação ao dia 21 de setembro, o dólar caiu 6,5% em relação ao euro. O CRB (Commodity Research Bureau, principal índice de preços de commodities) subiu 9,1%. Uma cesta formada pelas commodities exportadas pelo Brasil avançou ainda mais: 10,5%.

"A valorização do real foi menos significativa por causa da eficácia das medidas do governo. Países que não adotaram nenhum controle de capitais sofreram mais", disse Eduardo Velho, economista-chefe da Prosper Corretora. O dólar australiano, por exemplo, avançou 5,8% desde 21 de setembro e testou a máxima em relação ao dólar ontem.

As moedas de Brasil, Austrália, Nova Zelândia, Chile, Noruega e Canadá estão entre as mais afetadas pela queda do dólar, porque esses países são grandes exportadores de commodities.

Nathan Blanche, especialista em câmbio e sócio da Tendências Consultoria, atribui o descolamento do real à reversão de expectativas dos investidores, que ficaram assustados com as medidas do governo. O Brasil foi considerado um dos mais agressivos entre os países que adotaram medidas de controle de capitais.

IOF.O Brasil elevou por duas vezes consecutivas o IOF, sua principal arma até agora na "guerra cambial". No dia 4 de outubro, o imposto para o investimento em renda fixa subiu de 2% para 4%. O governo estava assustado com a queda do dólar, que bateu R$ 1,66 naquele dia.

O mercado achou a dose do remédio fraca e insistiu. O dólar chegou a R$ 1,65 já no dia seguinte (5 de outubro), nível mínimo atingido no período mais recente. Com o início das especulações de que o governo brasileiro adotaria medidas mais duras, a tendência começou a virar.

No dia 18 de outubro, o IOF para renda fixa subiu de novo, para 6%. O governo elevou ainda o IOF pago nas garantias para operar no mercado futuro de 0,38% para 6%. A pancada assustou os investidores e o real passou a oscilar perto de R$ 1,70.

De acordo com o economista do JP Morgan Júlio Callegari, as medidas do governo praticamente secaram o fluxo de capitais de curto prazo, cuja rentabilidade ficou prejudicada.

Ele alerta, no entanto, que esses recursos representam apenas 15% dos dólares que chegam ao País. O restante está em ações e investimentos produtivos.

¿Se a tendência de desvalorização do dólar segue, o mercado vai testar novamente os limites do governo no câmbio", disse Callegari. A aposta da maioria dos analistas é de que o dólar vai seguir se desvalorizando.

Callegari alerta que, da próxima vez, não bastará elevar o IOF na renda fixa, porque o efeito já está esgotado. Se quiser continuar segurando o real, o governo terá de usar remédios mais amargos, que atinjam outros fluxos de recursos. É o caso do IOF em ações e de retomar a cobrança de Imposto de Renda (IR) no investimento estrangeiro.