Título: Brasil tem de evitar o risco do superaquecimento, diz FMI
Autor: Farid, Jacqueline
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/11/2010, Economia, p. B4

Na avaliação de um diretor da instituição, ajuste fiscal deve ocorrer em 2011, primeiro ano do governo Dilma Rousseff

O Brasil deve estar preparado para evitar o "superaquecimento" da economia e o melhor remédio é um aperto fiscal em 2011, primeiro ano de governo de Dilma Rousseff. O alerta foi dado ontem pelo diretor do departamento de hemisfério ocidental do Fundo Monetário Internacional (FMI), Nicolás Eyzaguirre.

Em evento realizado pela revista britânica The Economist, em São Paulo, o especialista alertou que muitos fatores estão impulsionando a economia brasileira, como a alta do preço das commodities, o forte afluxo de investimento estrangeiro e a situação precária das nações ricas.

"O Brasil tem muitas forças propulsoras. Se não quiser enfrentar um superaquecimento no meio do caminho, precisa começar a implementar moderação na política fiscal e no crédito", disse Eyzaguirre. "Vocês precisam alterar a política fiscal para segurar seus cavalos".

O funcionário do FMI foi cuidadoso ao escolher as palavras para avaliar a política fiscal brasileira. Ele disse que as medidas contracíclicas foram "apropriadas" em 2009 quando a economia global estava em um "buraco negro", "compreensíveis" em 2010 quando as "águas continuavam turbulentas", mas que é "aconselhável" mudar a política fiscal em 2011.

"Não podemos dizer que o Brasil está atrasado na retirada dos estímulos. Mas se continuar com a expansão feita até agora poderá colocar em risco sua economia", disse. "Tem que administrar os bons tempos. É uma oportunidade maravilhosa, mas o desafio também é grande".

Outra preocupação do FMI é com uma bolha de crédito nos mercados emergentes. Eyzaguirre afirmou que o excesso de crédito reduz o estímulo de poupança dos consumidores e pode levar o Brasil a um déficit em conta corrente significativo.

O seminário de ontem reuniu uma série de economistas brasileiros de peso - todos com um perfil ortodoxo. A avaliação geral é que a economia já está superaquecida e que um ajuste fiscal é essencial para o próximo ano.

"O gasto público está muito alto. Não vamos nos enganar com o superávit primário que foi anunciado e é uma manipulação contável inacreditável", disse o ex-presidente do Banco Central e sócio da Rio Bravo Investimentos, Gustavo Franco.

Ele disse que a economia está superaquecida e que a correção deve vir pela política fiscal. Mas ressaltou que seria uma "pena" se ocorresse por meio de aumento de impostos. Na sua avaliação, a proposta de retorno da CPMF é apenas um "balão de ensaio" para testar a sociedade. "Não são os governadores que estão pedindo isso (retorno da CPMF). É conversa fiada", disse.

Affonso Celso Pastore, também ex-presidente do BC e sócio da ACPastore, disse que está preocupado que o novo governo defenda que o crescimento da economia depende de mais gastos públicos. "É possível que o governo aperte a política fiscal, mas eu não acredito".

Controle de capital. O FMI manteve a posição de apoiar medidas de controle de capital. Para tentar conter a entrada de dólares, o Brasil elevou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para a renda fixa e o mercado futuro de câmbio.

"É impossível lidar com todas essas forças propulsoras na economia hoje com apenas uma ferramenta", disse Eyzaguirre, que foi ministro da Fazenda do governo Ricardo Lagos no Chile e chegou a adotar medidas de restrição de fluxo de dólares.

"Estamos com um espírito compreensivo para medidas de controle de capital, mas não há mágica. É preciso também adotar outras políticas, como controlar os gastos, permitir uma certa valorização do câmbio e implementar mais regulação".