Título: Cristina tentou subornar deputados para aprovar orçamento, diz oposição
Autor: Palacios, Ariel
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/11/2010, Internacional, p. A16

Escândalo argentino. Na primeira crise envolvendo a Casa Rosada desde a morte de Kirchner, no mês passado, opositores afirmam que governo buscou comprar votos para conseguir passar lei orçamentária - apresentada na quinta-feira - no Legislativo

A oposição argentina acusa o governo da presidente argentina, Cristina Kirchner, de tentar subornar deputados, comprando votos para facilitar a aprovação dos projetos encaminhados pelo Executivo. Segundo as denúncias, a Casa Rosada - o palácio presidencial - ofereceu as propinas para tentar fazer passar no Legislativo a proposta de orçamento de 2011, debatida e votada na madrugada de quinta-feira.

Marcos Brindicci/Reuters-16/7/2008 Após 14 horas de debate, o governo não conseguiu aprovar o projeto e, por 117 votos a favor a 112 contra, a oposição conseguiu encaminhá-lo de volta à Comissão de Orçamento do Congresso. A acusação de suborno é a primeira suspeita de corrupção que envolve o governo de Cristina após a morte do marido, o ex-presidente Néstor Kirchner.

Duas deputadas afirmaram publicamente ter sido alvo de pressões e tentativas de subornos por parte de altos funcionários do governo. As suspeitas foram reforçadas pela constatação de que - coincidentemente - 12 deputados de partidos da oposição foram embora misteriosamente do plenário pouco antes da votação, o que favoreceria o governo. Diversos parlamentares informaram à imprensa, sob condição de anonimato, que tinham recebido de integrantes do governo um amplo leque de ofertas, que ia do suborno explícitos a verbas para suas províncias, além de contratos.

"Houve "Banelco", mas de Cristina", acusou a deputada Elisa Carrió, líder da Coalizão Cívica, de oposição, em alusão à marca de um cartão de débito bancário que se tornou metáfora para designar o pagamento de subornos.

O advogado constitucionalista Ricardo Monner Sans - que denunciou vários escândalos de corrupção dos governos dos ex-presidentes Carlos Menem e Fernando De la Rúa - entrou ontem com uma denúncia na Justiça pela suspeita de oferta de subornos. "Integrantes do governo ofereceram de 50 mil pesos (US$ 12,5 mil) para cima. Além disso, usaram a frase "o que você quiser" em conversas para que os deputados deixassem o plenário."

Uma das deputadas que denunciaram as pressões da Casa Rosada, Elsa Álvarez, da União Cívica Radical (UCR), de centro, disse que "um integrante do alto escalão do governo" telefonou-lhe insistentemente no celular, quando estava no plenário, para pedir que se levantasse de sua poltrona, já que para o governo era "absolutamente necessário" conseguir a aprovação do orçamento. Álvarez declarou que dará os nomes dos acusados na terça-feira.

A outra parlamentar, Cinthya Hotton, única deputada do partido de direita Valores Para Meu País - que denunciou "pressões e ofertas" de integrantes do governo -, sustentou que apresentará à Justiça o nome das pessoas que "tentaram desviar" o voto dele.

Perna inflamada. Silvia Storni, da UCR, uma das deputadas que saíram antes da votação, explicou sua ausência com o argumento de que havia passado mal durante a sessão, pois tinha uma perna inflamada, o que teria tornado difícil ficar sentada muito tempo durante as sessões da Câmara.

No entanto, apesar do problema, a deputada enfrentou uma viagem de fez 700 quilômetros até a Província de Córdoba, onde reside, logo depois de deixar a sessão. "Vim para cá porque aqui eu tenho meu plano de saúde", disse, hesitante, ao canal de TV Todo Notícias, quando teve de explicar sua viagem.

O presidente da UCR, Ernesto Sanz, afirmou que "pedirá explicações" aos oito deputados da UCR que foram embora do plenário antes da votação. Uma posição semelhante foi adotada por Federico Pinedo, chefe do bloco do Proposta Republicana (PRO), visivelmente irritado pela saída repentina de quatro de seus deputados do plenário.

O deputado Felipe Solá, do peronismo dissidente, um dos presidenciáveis da oposição, não poupou críticas ao governo, indicando que a Casa Rosada costuma comprar votos com frequência. "Quando o governo precisa conseguir a aprovação de uma lei, sai às compras pelo Congresso", disse com ironia.