Título: Preço máximo da passagem é incompatível com renda no Brasil
Autor: Rodrigues, Alexandre
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/11/2010, Economia, p. B3

Críticos têm dúvidas sobre a demanda de passageiros e dizem que a tarifa-teto pode ser a maior do mundo

Sem paralelo no Brasil, a demanda de passageiros do Trem de Alta Velocidade (TAV) é o item que levanta mais dúvidas entre os críticos do projeto. Em um estudo realizado para o Senado Federal, o consultor legislativo Marcos Mendes sustenta que o preço máximo para a classe econômica de R$ 199 estimado para as passagens do TAV pode ser incompatível com o padrão de renda brasileiro.

"O edital fixa em R$ 0,49 (US$ 0,27) por quilômetro a tarifa-teto, valor que supera o cobrado no Japão, que é de aproximadamente US$ 0,25 e é, provavelmente, a mais cara do mundo", disse Mendes. Ele lembra que a demanda do TAV será sensível ao preço, na competição com os transportes rodoviário e aéreo. Para o pesquisador, o custo da obra de US$ 33,4 milhões por quilômetro tem "diversas evidências de subestimação" abaixo do padrão internacional e sem considerar riscos de construção.

Em julho, antes da definição das condições de financiamento do projeto, cálculos preliminares feitos pelo professor de finanças do Ibmec-RJ, Luiz Ozório, também indicaram baixa viabilidade econômica do TAV com a tarifa-teto estabelecida. Seria necessário praticamente lotação integral constante para o retorno comercial do trem.

O modelo do financiamento de R$ 20 bilhões pelo BNDES com garantia do Tesouro Nacional também gerou controvérsia por deixar para o contribuinte a conta de um eventual fracasso. Como o BNDES não pode emprestar num só contrato mais do que o equivalente a 25% do seu patrimônio de referência, atualmente em torno de R$ 60 bilhões, a medida provisória 511 autorizou o Tesouro a garantir todo o crédito, anulando o risco do banco estatal.

Em caso de inadimplência, a União cobre o calote até o banco executar as garantias da concessionária, ações e recebíveis do próprio empreendimento. A medida também prevê o subsídio de R$ 5 bilhões do Tesouro em caso de receita abaixo do estimado nos 10 primeiros anos de operação.

"Antes mesmo antes de sair do papel esse trem-bala já mostra alta velocidade para abocanhar o dinheiro público de forma irresponsável", criticou o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), cujo partido vai questionar a constitucionalidade da medida Supremo Tribunal Federal (STF) por ingerência em questão orçamentária.

O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, classificou a hipótese de fracasso do TAV como "extremamente improvável" e disse que as garantias do Tesouro não serão acionadas. "É uma rede de segurança de última instância, que está sendo feita para não ser usada", disse Coutinho, alegando que se trata apenas de uma forma de estimular maior participação no leilão, marcado para 16 de dezembro.

FICHA TÉCNICA

Ligação: Campinas - São Paulo - Rio de Janeiro Extensão total: 510 quilômetros

Velocidade máxima 350 km/h

Estações previstas entre 7 e 9

Valor máximo da tarifa em classe econômica R$ 199

Demanda 32 milhões de passageiros por ano, 89 mil por dia

Duração da obra 6 anos

Empregos gerados 12 mil

Prazo da concessão 40 anos

Custo total R$ 33,1 bilhões

Investimento dos acionistas privados R$ 7 bilhões

Participação estatal no empreendimento R$ 3,4 bilhões para custear desapropriações convertidos em ações da operadora

Financiamento público R$ 19,977 bilhões ou 60,3% do investimento total, o que for menor, com prazo de 30 anos e custo de Taxa de Juros de Longo Prazo (6%) e spread de 1%, com possibilidade de repactuação para 3% em caso de receita abaixo da estimada