Título: Bancos Centrais discutem atuação na crise global
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/11/2010, Economia, p. B16

Em encontro de presidentes de BCs, Meirelles, Trichet e Bernanke falam em "soluções globais", mas não debatem medidas concretas

Todos os discursos falam em "coordenação internacional" e em "soluções globais para problemas globais", mas na prática a política dos bancos centrais é outra.

Reunidos na sede do Banco Central Europeu (BCE) para a 6.ª Conferência de Bancos Centrais, em Frankfurt, Alemanha, os presidentes do Federal Reserve (Fed), Ben Bernanke, do BCE, Jean-Claude Trichet, e do BC do Brasil, Henrique Meirelles, discutiram a atuação dos BCs na crise financeira.

Todos enalteceram as próprias ações durante os dois primeiros anos da crise e defenderam a coordenação das políticas monetárias, "reforçada" no G-20 de Seul, há uma semana.

Convidado para uma mesa redonda ao lado de Bernanke, Trichet e do diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn, Meirelles trocou elogios com os colegas.

Na hora de falar dos problemas conjunturais, entretanto, cada autoridade monetária foi para um lado. Em seu primeiro discurso após as críticas recebidas pela injeção de US$ 600 bilhões na economia americana, Bernanke foi duro em sua defesa.

"O melhor meio de continuar a oferecer fundamentos econômicos sólidos que sustentam o valor do dólar, assim como a retomada mundial, são políticas que levem a uma retomada do crescimento robusto em um contexto de estabilidade dos preços nos Estados Unidos", afirmou.

Bernanke disse ainda que o objetivo da medida, reprovada do Brasil à China, passando pela Europa, é apoiar a retomada econômica, promover o crescimento mais rápido do emprego e reduzir os riscos de deflação.

"A trajetória econômica nos EUA corre o risco de ver milhões de desempregados e subempregados por muitos anos. Para a sociedade, esse prognóstico é inaceitável." A autoridade monetária americana também acusou a China e "outros países emergentes" de controlar a valorização de suas moedas, gerando desequilíbrios mundiais.

Ao seu lado, Meirelles respondeu com diplomacia. De maneira polida, afirmou que os bancos centrais precisam atuar em conjunto, mas argumentou que "cada jurisdição" precisa estar atenta ao impacto dos desequilíbrios globais na sua economia.

Minutos depois, o brasileiro almoçou em separado com Trichet, Bernanke e Strauss-Kahn. A seguir, ao falar com jornalistas, foi ainda mais claro sobre o que dissera na palestra. "O Brasil não está adicionando nenhum desequilíbrio à economia global", garantiu, referindo-se à elevação da alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). "Mas também não vamos absorver nenhum peso adicional causado pelos desequilíbrios. E Bernanke reconheceu que temos esse direito."

Mediando o encontro, Trichet - envolvido em nova rodada da crise do euro, agora na Irlanda - riu da própria sorte ao comentar a desunião dos países da UE. "Ainda temos progressos a fazer (sobre coordenação) na Europa", comentou, com bom humor. Já Strauss-Kahn fez o papel de bombeiro. Lembrou que muito ainda precisa ser feito em coordenação global e advertiu: "Divergências seriam um desastre para a economia mundial".