Título: Inflação é o desafio
Autor: Alberto Tamer
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/11/2010, Economia, p. B4

Saíram os nomes da equipe econômica da nova presidente. Banco Central, Fazenda, Planejamento e sinais de que nada muda no BNDES. Todos técnicos e sem surpresa. O mercado não se "acalmou", simplesmente, porque estava calmo com os nomes cogitados.

Dilma reafirma, em comunicado oficial, que determinou aos ministros que "assegurem a continuidade da bem-sucedida política econômica do governo Lula - baseada no regime de metas de inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal - e promovam avanços que levarão o Brasil a vencer a pobreza e alcançar o patamares de nação desenvolvida."

A dúvida permanece no anúncio prematuro de uma taxa real de juros (sem inflação) de 2%. Numa primeira fase, juro não é causa das pressões inflacionarias. Taxa mais elevada ou baixa depende da inflação. O novo governo vai receber uma inflação pouco acima de 5%, com tendência de alta nos primeiros meses de 2011 e com pressão dos preços externos das commodities agrícolas.

Como reduzir juros reais sem pressionar a inflação? O governo pode contar com uma política fiscal mais severa, mas o efeito sobre a demanda e preços serão sentidos em seis meses até que as medidas apresentem resultados. E aqui entra também o novo salário mínimo - com repercussão positiva sobre o consumo, mas negativa nas contas publicas. Esse é o maior desafio do novo governo. Ele mostra a intenção de seguir o melhor caminho - não mudar o que deu certo - mas enfrenta realidades interna e externa menos desfavoráveis.

Não é uma afirmação contraditória, como parece. Lula não recebeu nenhuma "herança maldita", mas uma economia que saía de choques externos, agravada pela indispensável, embora tardia, mudança para o câmbio flutuante. Mais grave para o governo que assumia era a desconfiança que ele gerou no mercado internacional. Seu mérito indiscutível foi desfazê-la imediatamente, nomeando Palocci e Meirelles e anunciando que ia seguir e aprofundar o que Fernando Henrique havia feito. Tranquilizou rapidamente os investidores externos dos quais o Brasil precisava.

A política de Meirelles e Palocci, seguida por Mantega, deu certo e o Brasil estava preparado quando a crise levou a economia mundial à recessão.

Graças à rápida ação do governo, reduzindo impostos e liberando compulsório, o abalo sísmico não foi apenas uma "marola", mas uma onda superável no País. Mesmo porque há muito a economia crescia sustentada pelas medidas de incentivo à renda representada por um reajuste de 53% do salário mínimo acima da inflação.

O grande mérito de Fernando Henrique foi ter acabado com a hiperinflação de 2.000% ao ano sem jogar a economia na recessão - um fato raríssimo na história mundial. O de Lula foi ter mantido isso, trazendo a inflação de 12% para cerca de 5%. O mérito que os economistas veem agora em Dilma é anunciar que continuará a política do governo que sai, com a manutenção do ministro da Fazenda e um técnico respeitado no BC, e aprofundar o combate a miséria, não apenas por razões sociais, mas econômicas.

A filosofia econômica e social que veio deste governo é que pobres - e são mais de 30 milhões - quando ganham mais, saem comprando porque precisam. E quando compra, estimula a produção e emprego.

Resta saber até quando Dilma poderá conter as pressões para evitar aventuras dos chamados "desenvolvimentistas" do seu partido, aqueles mesmos que Lula rejeitou. Eles querem crescimento a qualquer custo. Esquecem o que Lula e Fernando Henrique aprenderam que o maior inimigo que corroí a pequena renda das famílias é a inflação.

A presidente recebe uma economia em crescimento, mas uma inflação em alta, uma economia mundial ainda retraída, um mercado financeiro internacional instável e, acima de tudo, pressões fiscais para enfrentar. Ela sinaliza, agora, que vai seguir o caminho certo. É esperar com alguma confiança.