Título: Efeito de compulsório na economia dura pouco
Autor: Nakagawa, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/12/2010, Economia, p. B6

Ritmo de concessão de crédito cresce meses depois da alta dos compulsórios

O aumento do recolhimento compulsório que bancos fazem ao Banco Central (BC) reduz apenas temporariamente a força do crédito. Cruzamento de dados do BC feito pelo "Estado" mostra que as últimas mudanças do depósito obrigatório afetaram o ritmo dos financiamentos, mas o efeito foi revertido em poucos meses.

O fenômeno foi observado nas duas últimas altas do compulsório: começo de 2008 e início de 2010. O ritmo da economia predominou na decisão de concessão de crédito.

Na sexta-feira, o BC anunciou medidas que, entre outros objetivos, tentam reduzir a velocidade dos novos financiamentos. Isso tende a acontecer porque as instituições terão de recolher mais dinheiro ao BC, o que reduz a capacidade de oferecer crédito. Ao todo, segundo o BC, bancos deverão elevar o recolhimento obrigatório em R$ 61 bilhões.

Há pouco meses, entre março e abril de 2010, o BC reverteu alguns benefícios concedidos durante a crise e o recolhimento de compulsórios cresceu R$ 75,6 bilhões em dois meses. A medida aconteceu em meio à forte reação da economia e à expansão acelerada dos empréstimos.

Os efeitos do aperto foram sentidos em abril: o volume de novos empréstimos caiu R$ 15,3 bilhões na comparação com março. Proporcionalmente, o volume recuou 8,7%. Mas a queda foi quase integralmente revertida nos 60 dias seguintes, quando o volume cresceu R$ 12,3 bilhões.

Leasing. Antes da crise, em maio de 2008, ocorreu situação semelhante, quando passou a ser recolhido compulsório sobre depósitos de empresas de leasing. A medida elevou o depósito ao BC em R$ 21,1 bilhões em um mês. O volume de crédito caiu R$ 2,3 bilhões ante abril.

Nos meses seguintes, o recolhimento desses depósitos aumentou gradualmente 5 pontos a cada bimestre. No entanto, em junho a concessão de empréstimos retomou a trajetória de alta e cresceu R$ 3,8 bilhões - o que anulou o efeito da medida.

"É importante observar essa questão por outros fatores, em especial a atividade econômica. Geralmente, o ritmo da economia tem maior influência no crédito", diz o professor de economia da USP Márcio Nakane. Para ele, medidas como as anunciadas na sexta-feira afetam a capacidade dos bancos de ofertar crédito, mas há aspectos com influência maior.

Nakane cita o acontecido em 2008, quando o BC passou a liberar depósitos compulsórios para tentar minimizar o efeito da crise. Em poucas semanas, foram liberados quase R$ 100 bilhões em compulsórios. Mesmo assim, a concessão mensal de empréstimos caiu quase R$ 30 bilhões entre agosto e o início de 2009. "A atividade deprimida determinou o movimento."

A mudança do compulsório afeta menos os bancos controlados pelo governo, que contam com outras formas de captação de recursos no mercado - também conhecido como "funding". Instituições como o Banco do Brasil e especialmente a Caixa Econômica Federal têm parte relevante do dinheiro do caixa originado em operações especiais, como o recolhimento de depósitos judiciais.