Título: BC tira R$ 61 bilhões da economia
Autor: Andrade, Renato; Froufe, Célia
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/12/2010, Economia, p. B1

Com o aumento das reservas que os bancos terão de depositar no BC, o governo afasta a necessidade de alta imediata dos juros

O governo fechou a torneira da liquidez de recursos no mercado. A partir do próximo dia 13, o Banco Central vai retirar de circulação R$ 61 bilhões, por meio da elevação no recolhimento obrigatório pelos bancos dos recursos captados em depósitos à vista (conta corrente) e a prazo (como os CDBs).

Os cálculos do novo compulsório começam a ser feitos na próxima segunda-feira. Mais do que retomar ao patamar anterior à crise financeira internacional, a decisão anunciada ontem de elevar o volume de dinheiro recolhido obrigatoriamente dos bancos ficou R$ 10 bilhões acima do período anterior à turbulência.

Durante o período de tensão global iniciado no final de 2008, o Banco Central passou a injetar o máximo possível de recursos na economia. A reversão das medidas de combate à crise começou em março deste ano, pouco antes de o BC retomar a alta dos juros. Com as medidas de ontem, a autoridade monetária completou esse ciclo.

Os recursos agora serão retirados do mercado em espécie, ficam depositados no Banco Central e passam a ser remunerados pela Selic, a taxa básica de juros, que hoje está em 10,75% ao ano. Com as novas regras, o BC passa a recolher 20% do total de depósitos a prazo.

Adicional. Além disso, haverá adicional de compulsório sobre os depósitos à vista e a prazo, de 8% para 12%.

Com menos dinheiro em circulação, ao lado das medidas diretas para segurar financiamentos de bens de consumo duráveis para pessoas físicas anunciadas ontem, o governo tenta conter a expansão do crédito. "Mas não há, de nenhuma maneira, impedimento ao crédito", garantiu o chefe do departamento de normas, Sérgio Odilon dos Anjos.

De quebra, ao enxugar a oferta de dinheiro no mercado, o BC também ajudou a derrubar a corrente, que começava a ganhar força, que apostava em aumento de juros pelo Comitê de Política Monetária (Copom) já na próxima semana. E fortaleceu a avaliação majoritária do mercado financeiro de que a impopular tarefa de aumentar a Selic deverá ficar para algum momento da primeira metade de 2011.

O presidente do BC, Henrique Meirelles, fez questão de enfatizar que o conjunto de medidas não necessariamente implica numa relação de causa e efeito com a decisão do Copom, mas admitiu que ele terá impacto na atividade econômica e na inflação, que são as miras da política de juros: "Ações macroprudenciais e ações convencionais de política monetária não são substitutas perfeitas, devem ser aplicadas por finalidades específicas."

Equivalência. Segundo o presidente do BC, essa análise foi reforçada nos últimos anos, depois da crise. "A experiência dos bancos centrais sugere que há uma equivalência importante entre ações macroprudenciais, que afetem as condições de crédito e liquidez, e as ações convencionais de política monetária."

O diretor de Política Monetária do BC, Aldo Mendes, reconheceu que as medidas devem ter efeito no crédito e na inflação, apesar de não substituir os efeitos da Selic. O curioso é que, ao retomar boa parte dos compulsórios reduzidos na crise, em março passado, Aldo enfatizou por diversas vezes que a medida não tinha impacto na taxa de juros de mercado e na inflação.

Segundo uma fonte do governo, as medidas de ontem podem ajudar a conter a inflação, mas as pressões de preços aumentaram recentemente, com a alta das cotações das commodities (matérias primas), principalmente dos alimentos. A maioria dos analistas econômicos, diz essa fonte, acha que a alta de juros necessária para conter a inflação em 2011 é maior do que os efeitos das medidas anunciadas ontem.

A despeito de reconhecer que as medidas são importantes, a economista-sênior para América Latina do RBS Global Bank, Zeina Latif, salientou que, à luz das expectativas inflacionárias em alta, seria necessário fazer ajuste dos juros. "O mercado entendeu que o BC ganhou tempo. Não é agradável subir os juros, mas, às vezes, é necessário fazer ajuste e seria interessante começar já."