Título: Para Israel, Itamaraty agiu de forma ''desleal''
Autor: Palacios, Ariel
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/12/2010, Internacional, p. A29

Na quinta-feira, Amorim recebeu o vice-primeiro-ministro israelense, mas só horas depois comunicou ao embaixador sobre a decisão brasileira

Era de se esperar que o conteúdo do anúncio do Itamaraty, reconhecendo o Estado palestino, fosse incomodar muito Israel. No entanto, a diplomacia israelense ficou especialmente revoltada com a forma como agiu o governo Luiz Inácio Lula da Silva, considerada "desleal" e "pouco amigável".

Na manhã de quinta-feira, o chanceler Celso Amorim conversou por mais de uma hora com o vice-primeiro-ministro de Israel, Silvan Shalom, que visitava Brasília. A carta do presidente Lula a seu colega palestino, Mahmoud Abbas, anunciando o reconhecimento, já havia sido enviada no dia anterior. Amorim, entretanto, não avisou Shalom sobre a decisão brasileira.

Horas depois do encontro entre o chanceler e o número 2 do governo israelense, o embaixador de Israel no Brasil, Giora Becher, foi chamado no Palácio do Itamaraty. Ele entrou no prédio pensando que discutiria o incêndio que matou 41 israelenses na quinta-feira, mas saiu avisado de que o governo brasileiro, no dia seguinte, reconheceria o Estado palestino.

Para Israel, a atitude de Amorim de manter em segredo a decisão brasileira durante a conversa com o vice-premiê foi deselegante. "Não esperávamos isso, tivemos um diálogo amigável. Foi um golpe desleal e desnecessário", afirmou uma fonte israelense ao Estado.

Entre os países do Bric, o Brasil era o único que ainda não havia concedido status de Estado à Autoridade Palestina - Rússia, Índia e China reconheceram Ramallah no fim dos anos 90. Todo o mundo islâmico - assim como a maior parte dos países africanos - também dá à AP a condição formal de Estado.

Israel argumenta que esse reconhecimento viola o chamado "Acordo de Oslo 2", firmado entre o israelense Itzhak Rabin e o palestino Yasser Arafat em 1995. Segundo israelenses, o documento prevê que o status final da Cisjordânia só poderá ser definido por meio de negociações diretas e, portanto, qualquer ação unilateral estaria vetada.

A interpretação palestina - e também a brasileira - do acordo é outra. Segundo o governo de Ramallah, resoluções do Conselho de Segurança da ONU determinam que a Cisjordânia e Jerusalém Oriental são território árabe ocupado por Israel. "Negociações são importantes e Israel deve entender que um Estado palestino com fronteiras (definidas) é um direito", diz Ibrahim al-Zeben, representante da Delegação Especial Palestina - que desde ontem passou a ser considerado embaixador pelo Brasil. / COLABOROU LUIZ RAATZ