Título: Só 0,01% teve acesso a crédito tributário
Autor: Paiva , Rocha
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/12/2010, Espaço Aberto, p. A2

Só duas empresas exportadoras conseguiram ter acesso mais rápido aos créditos tributários, utilizando os benefícios previstos no pacote de apoio à exportação do governo federal lançado em maio. Isso significa 0,01% dos mais de mais de 18 mil exportadores brasileiros.

Cerca de 4,1 mil empresas tentaram se habilitar no novo sistema, mas apenas 90 foram aprovadas e só duas efetivamente tinham recebido o dinheiro. Os dados foram coletados pela Receita Federal em meados de novembro e obtidos pela reportagem do Estado. Procurada na quinta-feira da semana passada, a Receita se recusou a fornecer dados mais atuais. Fontes ouvidas pela reportagem acreditam que os números podem ter melhorado um pouco em função de pressão feita dentro do governo, mas é pouco provável que tenham alterado o quadro geral.

Por lei, a exportação é desonerada de impostos, para não prejudicar a competitividade do País no exterior. Graças a isso, os exportadores tem direito a se creditar de PIS, Cofins, IPI e ICMS pagos se o destino do produto final for o mercado externo.

O governo, no entanto, dificulta a devolução do dinheiro no caso de empresas que não vendem o suficiente internamente para compensar todos os seus créditos. Estima-se que os exportadores tenham R$ 10 bilhões retidos nos cofres federais e R$ 20 bilhões nos cofres estaduais.

Sem folga. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu que a União não tem folga orçamentária para pagar os estoques de créditos, mas afirmou que o pacote resolveria o problema do fluxo. A promessa era devolver 50% dos recursos em até 30 dias.

Só que para ter acesso ao sistema, as empresas tem de cumprir uma série de exigências, como exportar mais de 30% do faturamento e não ter pendências tributárias. "Quando anunciaram o pacote, já prevíamos que ia ser difícil superar todos esses obstáculos", disse José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).

A fabricante de compressores Tecumseh é um exemplo. A empresa exporta a maior parte da produção e solicitou a devolução rápida dos créditos. O processo, no entanto, foi paralisado porque a Tecumseh não pagou cerca de R$ 30 em Imposto Territorial Rural (ITR). A companhia confirmou a informação, mas não deu entrevista.

Segundo Castro, da AEB, o ritmo de acúmulo de créditos pelos exportadores hoje é menor, mas por causa do fraco desempenho das exportações. As empresas estão destinando um porcentual menor das vendas ao mercado externo, logo é mais fácil compensar os créditos.

Confusão. O tema está provocando confusão no governo, com acusações entre os ministérios. Ao ser questionado na semana passada em café da manhã com jornalistas sobre o assunto, Jorge admitiu que estava frustrado. "Desse ponto de vista, é frustrante. Muito do que você planeja não tem como implantar. É difícil", disse. Os Ministérios do Desenvolvimento e da Fazenda não deram entrevista.

Na época do anúncio, Mantega disse que as medidas eram "tudo de bom", porque ajudavam a exportação sem pressionar a inflação e até elevariam a arrecadação. O setor privado, no entanto, disparou uma saraivada de críticas, classificando o pacote de "embrulho" e "calote oficial".

Uma alta fonte da equipe econômica disse que é complicado tirar do papel esse tipo de medida no último ano de governo. "É preciso acompanhar passo a passo", explica. Segundo essa fonte, a decisão política foi tomada, mas esbarrou na burocracia.

Os técnicos da Receita são treinados para elevar a arrecadação, estão preocupados em evitar fraudes e relutam em conceder esse tipo de benefícios. Também estão preocupados com o ajuste fiscal, necessário em 2011.

"A situação do exportador hoje é pior do que na crise. Antes, o problema era conjuntural. Agora temos uma questão estrutural por causa do real. A demanda está voltando, mas não temos competitividade", disse Roberto Giannetti da Fonseca, diretor do departamento de comércio exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).