Título: Rentabilidade e o setor de infraestrutura
Autor: Sales, Cláudio J.D.
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/12/2010, Economia, p. B2

O que se pode concluir do seguinte tipo de manchete que sempre visita as páginas de jornais e revistas: "Empresa X tem lucro de R$ 1 bilhão"? Absolutamente nada. O leitor só saberá se a empresa X está indo muito bem - ou muito mal - se conhecer o volume de investimentos que foi aportado à empresa para que ela fosse capaz de produzir aquele lucro bilionário.

Se a empresa X precisou investir R$ 20 bilhões para obter o lucro de R$ 1 bilhão, ela ainda tem um longo desafio pela frente. A empresa só passará a ter geração positiva de valor econômico após recuperar o capital inicialmente empregado. Caso não consiga recuperá-lo, a empresa estará num estado de "destruição de valor econômico".

Setores de infraestrutura são muito parecidos com a empresa X. Nestes setores são aportados volumes elevados de capital e o retorno é de longo prazo. No caso do setor elétrico, a base empregada de capital é de dezenas de bilhões de reais e os contratos de concessão variam entre 15 e 35 anos.

Qualquer interpretação sobre a rentabilidade de setores de infraestrutura que ignore essa característica é conceitualmente equivocada. E em setores de infraestrutura que também são regulados pelo poder público - como a energia elétrica - o problema é ainda maior: com base na falácia de "alta rentabilidade" pode ocorrer o lamentável fenômeno de represamento artificial de tarifas.

Na última quinta-feira houve uma audiência pública na Aneel, a agência reguladora dos serviços de energia elétrica, para ouvir as contribuições da sociedade sobre a proposta de metodologia de cálculo que definirá, para os próximos quatro anos, as contas de luz dos brasileiros que são atendidos por 63 distribuidoras de eletricidade.

Não se trata de equilibrar "interesses dos consumidores" com "interesses das empresas". Empresas desequilibradas por causa de tarifas artificialmente baixas prejudicam, em última análise, o próprio consumidor, que deixa de ser atendido por serviços com a mínima qualidade. Isso já aconteceu no Brasil das décadas de 1970 e 1980: para atender a objetivos políticos, as tarifas de eletricidade foram represadas e o serviço sucumbiu.

O objetivo da boa política tarifária conduzida por um bom regulador é chegar a um conjunto de regras capazes de produzir tarifas que equilibrem, de um lado, a modicidade tarifária e, de outro, a saúde econômico-financeira das 63 áreas de concessão.

Dito isso, a saúde econômico-financeira do setor elétrico - intensivo em capital - precisa ser medida com um indicador apropriado. O Economic Value Added (EVA) é um indicador adequado porque incorpora o custo de oportunidade do capital. Indicadores como o Ebitda e Lucro Líquido podem conduzir a conclusões distorcidas porque desconsideram importantes custos associados às empresas de capital intensivo: depreciação, juros, impostos e amortização de dívida.

Segundo estudo da Stern Stewart & Co., o EVA acumulado de 1998 a 2009 para uma amostra de 22 empresas foi de R$ 49,3 bilhões negativos, o que indica perda econômica massiva. A rentabilidade foi permanentemente negativa entre 1998 e 2006, houve ligeira recuperação entre 2007 e 2008, mas em 2009 a rentabilidade medida pelo EVA voltou a apresentar trajetória declinante.

O regulador sabe que a interrupção da trajetória de EVA negativo é importante para que não ocorra a inviabilização das concessionárias de energia. Tarifas em patamares inadequados implicarão sucateamento do parque instalado e queda da qualidade do serviço. Além disso, as empresas não terão os recursos necessários para viabilizar os investimentos crescentes que serão impostos pelo crescimento econômico que se acelera.

Esta é a hora em que o regulador precisará provar seu compromisso com critérios técnicos e sua isenção diante de pressões político-populistas. No mundo da infraestrutura e dos serviços públicos eficientes, não há espaço para ideologias e artificialidades.

PRESIDENTE DO INSTITUTO ACENDE BRASIL.