Título: Com ameaças, ministro perde credibilidade
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/01/2011, Economia, p. B1

Nathan Blanche, SÓCIO-DIRETOR DA TENDÊNCIAS CONSULTORIA INTEGRADA

Um dos maiores especialistas em câmbio do País, Nathan Blanche, sócio da consultoria Tendências, disse que a estratégia de segurar o dólar no grito "simplesmente não funciona". Ele avalia que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, perde credibilidade ao mexer com as expectativas do mercado, sem tomar medidas efetivas. A seguir, trechos da entrevista:

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, tentou segurar o dólar no "grito". Vai conseguir?

É proibitivo que ministro da Fazenda e presidente de Banco Central falem sobre câmbio e juros, porque mexem com as expectativas de mercado e, se de fato não efetivam isso, perdem credibilidade. Se você olhar a curva do mercado de câmbio (ontem), o dólar subiu quando anunciaram a fala do ministro, mas em seguida voltou. Não adianta. A formação da taxa de câmbio depende exclusivamente dos fundamentos da economia, que são muito bons. Não existe economia forte com moeda fraca ou vice-versa.

Quais são os riscos dessa estratégia do governo?

Simplesmente não funciona. Graças à intervenção do Banco Central, que amenizou as volatilidades, o real já foi a moeda que menos se apreciou entre os grandes exportadores de commodities. Na África do Sul, o rand subiu 11,3%. O dólar australiano se valorizou 13,27%. Na Nova Zelândia, a alta foi de 6,57%. O real subiu 5,09%.

Mas isso não é resultado do aumento do IOF?

Não. O IOF ataca capitais de curto prazo, e o estoque no Brasil é muito pequeno. O que importa são os papéis de renda fixa de longo prazo, que são muito importantes para financiar a dívida pública. O mesmo ministro que fala hoje em controle cambial assinou uma medida provisória em 2003, que isentou totalmente de imposto de renda o capital estrangeiro. O Brasil é um país carente de poupança. Se você impedir que os estrangeiros venham para o País, as taxas de juros vão para o céu, porque não temos poupança externa.

Mantega disse que as medidas para segurar o dólar são "infinitas". Qual é a sua avaliação?

De fato, são infinitas. Assim como os prejuízos desse artificialismo na formação da taxa de câmbio também são infinitos. Se ele tiver sucesso na intervenção, o câmbio vai a R$ 2. Só que, se isso ocorrer, a taxa de juros para manter a inflação na meta tem de ser de 14% ao ano. No médio prazo, o câmbio reflete sempre os fundamentos da economia.

O governo pretende fazer um ajuste fiscal e acredita que contribuirá para reverter o fortalecimento do real. Faz sentido?

Isso é produtivo. O problema para a competitividade dos produtos brasileiros não é a taxa de câmbio, mas o custo Brasil. Se o governo ajustar suas despesas, com aumento do superávit primário sem artificialismo, terá um amplo apoio. Será possível reduzir o custo Brasil e as taxas de juros vão cair. Esse é o ajuste de fato.