Título: Europa comemora sucesso da emissão de bônus de Portugal, mas crise persiste
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/01/2011, Economia, p. B1

Captação foi acima do previsto e mercados reagiram com fortes altas; hoje teste é com Espanha e Itália, que farão as primeiras emissões do ano

O governo do primeiro-ministro de Portugal, José Sócrates, conseguiu ontem uma captação acima do previsto para a primeira emissão de bônus de sua dívida e a Europa respira aliviada, mas apenas por um dia. Governos europeus voltaram a demonstrar que não têm uma estratégia clara sobre como lidar com a crise da dívida, abriram um novo conflito e ameaçam criar nova instabilidade.

O motivo agora é o tamanho do fundo de resgate que a UE teria de manter para acalmar os mercados. A Comissão Europeia defende uma expansão. França e Alemanha são contra.

Enquanto os políticos não tomam uma direção clara, os olhos do mercado estavam centrados no leilão de Portugal, considerado como um teste: se fracassasse, o governo de Portugal seria pressionado a buscar um resgate junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI), contaminando a economia da Espanha e colocando o euro em mais um drama. Hoje, o teste é com Espanha e Itália, que farão as primeiras emissões do ano. Apesar da euforia, os bancos portugueses estão cada vez mais dependentes dos fundos de ajuda do Banco Central Europeu (BCE), em um sinal de fragilidade do sistema financeiro português e do risco que o país ainda corre.

Há um ano, a União Europeia (UE) não consegue dissipar as dúvidas do mercado sobre a capacidade de seus membros em honrar as dívidas. Primeiro, foi a Grécia, que teve de ser socorrida. No fim de 2010, foi a Irlanda. A bola da vez agora é Portugal. Mas o grande temor é que, se Lisboa cair, a economia espanhola estaria ameaçada. Para a UE, porém, não haveria fundo suficiente para salvar a quarta maior economia do bloco e seria a própria sobrevivência do euro que estaria sob risco.

Não por acaso, o resultado das emissões de Portugal foram amplamente comemoradas, com investidores mais tranquilos. No total, Portugal vendeu em leilão 1,24 bilhão em papéis de sua dívida, com uma demanda três vezes superior à oferta. Para o governo português, essa foi a prova de que os mercados continuam confiando nos planos de reforma de Lisboa. "Não precisamos de resgate. Só de confiança", afirmou Sócrates.

Como resultado, as ações na UE tiveram a maior alta em 28 meses, o preço dos minérios disparou e o petróleo subiu. O Índice FTSEurofirst 300, que reúne as principais ações europeias, fechou em alta de 1,5%, com 1.163 pontos, o maior nível desde setembro de 2008, quando a crise mundial eclodiu. Paris ganhou 2,1%, Frankfurt, 1,8% Lisboa, 3,8% .

Depois de Portugal, o maior beneficiário das captações portuguesas foi a Espanha, cuja bolsa teve ontem forte alta (5,4%). Uma quebra em Portugal significaria um colapso do sistema bancário espanhol, amplamente exposto à economia de Lisboa. Ontem, o BBVA ganhou 9,5%, e o Sabadell, 9%. A emissão mostrou que Portugal ainda tem acesso ao mercado de créditos, o que significaria que a Espanha também não teria problemas em obter empréstimos para rolar a dívida pública, se necessário. Hoje, será a vez do Tesouro de Madri colocar no mercado entre 2 bilhões e 3 bilhões em papéis da dívida, em mais um teste. Já a Itália vai colocar a leilão outros 6 bilhões.

Ameaças. Mas, se em Portugal o governo se apressou em anunciar que essa era a prova de que não precisaria ser resgatado pelo FMI, como Irlanda e Grécia, há quem alerte que a comemoração está ocorrendo cedo demais. Portugal terá de captar cerca de 20 bilhões no mercado em 2011 e os maiores testes viriam em abril.