Título: Déficit da indústria atinge US$ 37 bi
Autor: Landim, Raquel
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/01/2011, Economia, p. B1

Resultado de 2010 está 125% acima do saldo negativo obtido em 2009 e assusta especialistas porque evidencia desindustrialização

O setor industrial registrou o pior rombo da sua história nas trocas com o exterior. No ano passado, o déficit da indústria da transformação (que converte as matérias-primas em insumos e produtos acabados) atingiu o recorde de US$ 37 bilhões, 125% acima do saldo negativo obtido em 2009. O resultado assusta os especialistas e revigora os temores de desindustrialização no País.

O cálculo foi feito pela Secretaria de Desenvolvimento da Produção, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, e obtido com exclusividade pelo Estado. Se forem excluídos itens com pouco grau de transformação como aço, açúcar ou celulose e considerados apenas os produtos manufaturados, o déficit atingiu US$ 70,9 bilhões em 2010.

De acordo com os especialistas, o rombo da indústria é uma consequência da crise global e do forte crescimento da economia brasileira. Com dificuldades para se recuperar da pior turbulência desde a década de 30 e com capacidade ociosa, os países ricos reforçaram o esforço exportador. O Brasil se tornou um alvo preferencial, graças à expansão do mercado doméstico.

As importações de produtos industriais aumentaram 40% em 2010, para US$ 143,2 bilhões. As exportações da indústria brasileira se recuperaram da crise, mas cresceram menos: 23,5%, para US$ 106,3 bilhões.

O câmbio valorizado também ajuda a baratear os produtos importados e a reduzir a competitividade da indústria local. O real forte é resultado das altas taxas de juros locais, que atraem capitais externos, mas também da política de expansão monetária dos Estados Unidos, que provoca uma desvalorização do dólar em relação a várias moedas.

Consequências. De acordo com o diretor do Instituto de Economia da Unicamp, Mariano Laplane, o agravamento do déficit da indústria traz efeitos indesejáveis, como demissões, menos arrecadação e redução do superávit comercial. Também acelera a desindustrialização, que é a perda de espaço da indústria no Produto Interno Bruto (PIB).

Graças às perdas da indústria, o saldo da balança comercial brasileira encolheu do recorde de US$ 46 bilhões em 2007 para US$ 20 bilhões no ano passado. O resultado positivo foi garantido pelo bom desempenho do agronegócio.

"Uma consequência que não é tão evidente, mas é mais grave no longo prazo são as oportunidades perdidas. Hoje temos um mercado doméstico em forte expansão, mas que está promovendo o crescimento da produção em outros países. Se for pontual, não é uma tragédia. O problema é se o fenômeno se tornar estrutural", diz Laplane.

A tese de desindustrialização da economia brasileira, no entanto, não é consenso entre os economistas. Para Bernardo Wjuniski, da Tendências Consultoria Integrada, não há desindustrialização no País porque os setores estão trabalhando próximos às máximas históricas de capacidade instalada.

"A produção não caiu. Estagnou em patamares elevados. A competição internacional dificulta a vida dos empresários, mas não é tão estrutural assim", disse o economista. " A produção industrial não cresce mais porque ainda não maturaram os investimentos necessários". Ele ressalta ainda que a influência do resultado da indústria no déficit em transações correntes do País é pequena.