Título: Escolas repetem crianças de 4 anos
Autor: Alvarez, Luciana ; Mandelli, Mariana
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/01/2011, Vida, p. A16

Regra para entrada no ensino fundamental afetou o fluxo dos alunos nas pré-escolas particulares; alguns pais recorrem à Justiça

As novas regras de idade para ingresso no ensino fundamental estão bagunçando a matrícula no ensino infantil paulista. A retenção de crianças que ainda não completaram 4 anos de idade foi parar na Justiça e provoca polêmica entre escolas e pais que não concordam com a medida.

Para obedecer a uma norma do Conselho Estadual de Educação (CEE) e evitar que em 2012 os alunos cheguem ao ensino fundamental com apenas 5 anos - a idade tem de ser 6 anos completos até 30 de junho -, as pré-escolas têm feito crianças com aniversário no segundo semestre "repetirem" de ano.

Foi o que aconteceu com o filho da secretária Ana Paula Soares, de 41 anos. Ela já tinha decidido tirar Gabriel, de 4, da escola por outros motivos. A decisão foi reforçada quando soube, em outubro, que o filho teria de ficar na mesma série. Na nova escola foi dada a opção de passar Gabriel de ano, mas Ana Paula preferiu "segurá-lo". "Acho que, por estar num lugar novo, ele não vai se sentir prejudicado. Mas dá a impressão de que cada escola faz o que quer e cada Estado segue uma regra."

É o caso de Guilherme, de 4 anos, filho da consultora Taís Faria, de 37. Eles viviam em São Paulo e agora moram no Espírito Santo, que usa 31 de março como data de corte - Guilherme faz 5 em maio. "Quando fui matriculá-lo aqui, ele ficou retido", conta. Ela procurou outras escolas, mas acabou desistindo. "Antes ser o mais velho que o mais novo da turma."

A retenção desagrada até mesmo a membros do Conselho Nacional de Educação (CNE), como César Callegari, que defendem que todas as crianças "evoluam normalmente". "Nas resoluções do conselho tivemos o cuidado de preservar o percurso educacional das crianças, para que elas não sejam apartadas de seu grupo", afirmou.

Segundo ele, o alinhamento na faixa etária correta deve ser feito quando a criança entra na escola, seja com 1, 2, 3 ou 4 anos. "Se os professores perceberem que uma criança está imatura e precisa ficar mais um ano no ensino infantil, ótimo. Mas esse diagnóstico deve ser feito regularmente, para todas, não com base na data de aniversário."

No Colégio Magister, algumas famílias pediram transferência e quatro pais entraram com ações na Justiça para os filhos, que têm entre 3 e 4 anos, não serem retidos. Três deles conseguiram liminares. "Alguns pais ficaram extremamente revoltados", conta Rosana Ziemniak, coordenadora da educação infantil.

Arthur Fonseca Filho, membro do CEE, diz lamentar que decisões referentes a educação sejam resolvidas por vias judiciais. "É pouco pedagógico", diz. Segundo ele, a falta de padronização dos níveis da pré-escola dificulta o processo.

Planejamento. No colégio Pio XII, a adaptação das idades começou em 2009, um ano antes de o ensino fundamental de nove anos se tornar obrigatório, e foi feita com enfoque individual. "Tivemos crianças com aniversário no segundo semestre que seguiram com a turma e hoje estão entrando no fundamental e outras que refizeram o ano", explica a orientadora pedagógica Patrícia Bissetti.

O diálogo com os pais, segundo as escolas, é o melhor caminho. "Cada criança é única e deve ser analisada individualmente", diz Linda Derviche Blaj, diretora da educação infantil do Colégio I.L.Peretz.

CORTE ETÁRIO

Entrada no fundamental Devem ser matriculadas no 1º ano crianças com 6 anos de idade completos até o dia 31 de março, segundo norma do Conselho Nacional.

Regra de transição Neste ano, crianças com 5 anos que já tenham cursado a pré-escola durante dois anos podem ser aceitas no fundamental.

Ensino infantil Para que as crianças cheguem ao fundamental com 6 anos, elas devem ingressar no penúltimo ano do ensino infantil (chamado de Jardim ou Pré) apenas ao completarem 4 anos.

Datas diferentes Como a resolução do Conselho Nacional não tem força de lei, alguns Estados adotam datas diferentes. Em São Paulo, o conselho estadual fez o corte etário em 30 de junho. Mas, no ensino público da capital paulista, a data usada é fevereiro.