Título: Grupos pró-Mubarak atacam multidão e convertem praça em campo de guerra
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/02/2011, Internacional, p. A10

Choques deixaram pelo menos 3 mortos e mais de 639 feridos; grupos que apoiavam o governo seriam formados por funcionários públicos, policiais à paisana e pessoas que receberam o equivalente a cerca de R$ 30 para engrossar a turba que enfrentou opositores

O local símbolo das manifestações pelo fim da ditadura egípcia, a Praça Tahrir, no centro do Cairo, virou ontem um campo de batalha entre partidários e opositores do presidente Hosni Mubarak. Segundo o governo, os confrontos deixaram 4 mortos e mais de 1.500 feridos, sob um clima geral de pânico sem precedentes nos nove dias de manifestações.

Opositores, porém, afirmam que o número de vítimas foi maior. A ação, segundo eles, mostraria a contradição entre o discurso de Mubarak - que se comprometeu a promover reformas, dialogar com outras forças políticas e não concorrer à reeleição em setembro - e as práticas de seu aparato parapolicial. Pouco antes dos choques, a TV estatal tinha transmitido uma ordem oficial, cuja fonte não esclareceu, para que todos os manifestantes abandonassem a prática.

Em mais de sete horas de confronto - com trocas de pedradas, socos, chicotadas e coquetéis molotov, além de investidas com cavalos e camelos -, o Exército nada fez para conter os manifestantes dos dois lados e a polícia nem sequer apareceu. As primeiras ambulâncias surgiram apenas quatro horas depois. No início da madrugada, um prédio da Praça Tahrir foi incendiado.

O diplomata líder da oposição e Nobel da Paz Mohamed ElBaradei pediu que o Exército intercedesse para proteger a população. Ele também culpou o governo pelas mortes e disse que as cenas de violência são "atos de um regime criminoso". "Estou preocupado. Essa é outra indicação de um regime criminoso usando atos criminosos", disse.

Segundo o Estado apurou, parte dos manifestantes pró-regime recebeu o equivalente a R$ 30 para participar do protesto e outra parte era de policiais a paisana. Muitos ainda eram funcionários públicos que tiveram dispensa. Segundo membros da oposição, alguns eram criminosos soltos das prisões de segurança máxima.

O conflito entre os dois grupos de milhares de pessoas pretendia decidir quem controlaria a Praça Tahrir. Opositores afirmam que só sairão da praça "mortos", enquanto governistas prometiam "limpar" o local, que fica ao lado do Museu do Cairo.

Até a madrugada de hoje, os manifestantes antigoverno conseguiam aplacar a investida dos partidários do regime, resistindo com pedras e coquetéis molotov. As manifestações de apoio ao presidente começaram pela manhã em diversas partes do Cairo, formando uma grande marcha até a praça onde se concentravam os opositores.

Pouco após os dois grupos se encontrarem, uma chuva de paus e pedras teve início, sob gritos de horror das pessoas presas no meio da multidão. Dezenas tiveram a cabeça atingida e tentavam parar o sangue com suas próprias roupas.

Em seguida, cerca de 40 pessoas montadas em cavalos e camelos cavalgaram pela praça, chicoteando manifestantes contrários a Mubarak. Alguns foram derrubados e espancados.

Jornais independente do Cairo, que chegaram hoje às bancas, afirmam que a violência foi premeditada. Segundo eles, há dois dias, bairros pobres da periferia receberam a visita de policiais, que organizaram as gangues. As ordens teriam vindo do vice-presidente Omar Suleiman