Título: França busca no G-20 acordo sobre commodities
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/02/2011, Economia, p. B11

País quer apoio do Brasil e de outros emergentes para regular operações financeiras com derivados de produtos agrícolas e metais

A França vai investir a partir deste fim de semana, na reunião ministerial do G-20 em Paris, em sua proposta de regulação dos produtos derivados de matérias-primas. O projeto, que envolve interesses do Brasil, foi confirmado ontem pela ministra da Economia da França, Christine Lagarde.

Em recado ao governo brasileiro, a executiva afirmou que a Europa não quer controlar os preços dos produtos agrícolas, mas de seus derivados nos mercados financeiros. A proposta é uma das mais delicadas a serem negociadas até novembro de 2011, quando será realizada em Cannes a reunião de cúpula do G-20.

Segundo Lagarde, a produção agrícola e o comércio de metais são dois exemplos de setores estratégicos que estão sendo alvo de especulação excessiva nos mercados financeiros.

A ministra citou oscilações nos preços do cobre, do algodão, do leite, do trigo e do milho para exemplificar o problema. "No mercado, troca-se o equivalente a 45 vezes a produção anual mundial de trigo e 24 vezes a de milho. E 85% das posições de compras desses produtos são detidas por atores do mundo financeiro", afirmou. "Suas atividades não têm vínculos reais com a mercadoria que trocam."

A proposta do governo francês, ressaltou a ministra, não é de criar mecanismos de administração de preços - a exemplo do Sistema de Estabilização de Receitas de Exportação (Stabex), extinto em 2000 -, mas sim reduzir a volatilidade, aumentar a transparência e os mecanismos de seguro, "para evitar distorções maciças e reduzir os riscos aos produtores".

"Não estamos propondo, porque somos franceses reguladores encarnados e administradores determinados, a administração de preços", ironizou a ministra. A seguir, reiterou sua proposta, em colaboração com o governo da Rússia: regular o mercado de derivados de matérias-primas. "Precisamos limitar os abusos, estendendo a regulação ao conjunto dos mercados e dos instrumentos do mercado."

A ministra informou ainda que o grupo de trabalho sobre o tema recebeu propostas da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a regulação de estoques para fins humanitários, que estão em análise. A ideia de regular o mercado de commodities não agrada aos emergentes, em especial Brasil e Argentina. Na semana passada, os ministros da Fazenda do Brasil, Guido Mantega, e da Argentina, Amado Boudou, firmaram posição comum pela não regulação.

Ontem, Lagarde afirmou que existe "muita incompreensão e muita ansiedade de alguns emergentes" e deu sinais de que o Brasil é um dos mais recalcitrantes: "Sobre a questão das matérias-primas, esperamos as propostas do Brasil. Eu repito aos nossos amigos brasileiros: nós não queremos administrar os preços".

De acordo com ela, a discussão pode atender os interesses brasileiros. "Queremos mais luz e regulação nos produtos derivados, como temos nos derivados financeiros." Outro desacordo entre as propostas da França e do Brasil no G-20 deve ser o controle de fluxos de capitais estrangeiros. Ontem, Lagarde insinuou que as medidas adotadas por países emergentes são protecionistas. "Países como o Brasil ou a Coreia do Sul implantaram barreiras ou obrigações para limitar os fluxos de capital internacional. É preciso questionar a natureza dessas obrigações."

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