Título: Investimento desacelera após recorde
Autor: Dantas, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/03/2011, Economia, p. B1

Após o tombo da crise global em 2009, investimento na economia fechou 2010 com alta de 21,8%, a maior da série histórica do IBGE

A forte recuperação dos projetos de expansão na indústria, infraestrutura e construção civil após o tombo imposto pela crise mundial em 2009 fez o investimento na economia fechar 2010 com alta de 21,8%, a maior da série histórica do IBGE. No entanto, o indicador mostrou desaceleração no fim do ano sem reposicionar a taxa de investimento no patamar anterior à crise.

Depois do crescimento acima de 28% nos dois primeiros trimestres de 2010, a formação bruta de capital fixo (FBCF), que traduz os investimentos na economia, começou a desacelerar no terceiro, com alta de 21,2% na comparação com o mesmo período do ano anterior. Nos últimos três meses do ano, o avanço foi de 12,3% nessa comparação. O freio é mais nítido ante o terceiro trimestre. A alta foi de 0,7%, contra 3,1% no período imediatamente anterior.

"A economia já está desacelerando e o investimento volta a exibir nossa fragilidade. O resultado na margem mostra uma tendência mais precisa para 2011 e essa desaceleração forte é muito decepcionante. O quarto trimestre mostra o consumo novamente crescendo à frente do investimento", avalia Roberto Messenberg, coordenador de Análises e Previsões do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

O economista chama a atenção para a forte ligação entre investimento e indústria e aponta outra inversão no último trimestre de 2010: o setor de serviços cresceu mais do que a indústria na comparação com o mesmo período de 2009: 4,6% e 4,3%, respectivamente. Na comparação com o trimestre imediatamente anterior, a indústria recuou 0,3% (segunda queda consecutiva) e o setor de serviços foi o único a crescer: 1,0%.

Por outro lado, no acumulado do ano, a indústria também bateu recorde, com alta de 10,1% do PIB industrial em 2010 puxada pelo setor extrativo mineral.

O destaque foi da produção de petróleo e de minério de ferro, mas boa parte do desempenho está ligada aos investimentos na expansão de capacidade facilitados pelo crédito direcionado e pelo câmbio valorizado que fez máquinas e equipamentos liderarem a pauta de importações.

A construção civil, outro componente importante do investimento, também teve alta expressiva nas contas nacionais em 2010, incentivada pelo crédito imobiliário: 1,6% em relação a 2009. A alta refletiu na elevação de 5,8% no pessoal ocupado do setor, um dos que mais sustentam emprego e renda em alta impulsionando o consumo. O comércio cresceu 10,7% na comparação com 2009. A mesma variação teve a intermediação financeira, expressa nos lucros recordes dos bancos.

Recomposição. Segundo o IBGE, a taxa de investimento fechou 2010 em 18,4% do PIB. Em 2008, quando a crise bancária americana desencadeada pela quebra do Lehman Brothers enxugou o crédito internacional, essa taxa foi de 19,1%. "Já podemos considerar a volta de uma trajetória forte de crescimento dos investimentos", avalia Fernando Puga, chefe de departamento da Área de Pesquisa Econômica do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Para ele, é possível considerar a recomposição da situação anterior à crise, já que a taxa de 2008 foi revisada para cima. "Se compararmos o quarto trimestre com o terceiro de 2008, quando começou a crise, o investimento já está 5,6% acima. Já recuperamos aquele vale", diz.

Estudo do BNDES estimou em R$ 3,3 trilhões a inversão total na economia até 2014. "Tudo indica investimento crescendo a 10% ao ano, puxando a economia. Fica um pouco abaixo esse ano por causa da contenção."

Messenberg, do Ipea, tem dúvidas. Para ele, o governo precisa atuar mais no consumo para formar poupança interna e aumentar o investimento público em infraestrutura para reduzir os custos da indústria e recuperar a sua competitividade no cenário em que o câmbio dificulta exportar e amortiza o efeito da demanda interna na produção com a concorrência dos importados.

"Enquanto não tivermos um patamar mais elevado do produto industrial, vamos ficar nesse lengalenga, crescendo pouco para evitar inflação", afirmou.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) comemorou o crescimento da economia e do PIB industrial como resultados "expressivos", mas manifestou preocupação com a retração da atividade industrial identificada pelo IBGE no segundo semestre.

"A trajetória do desempenho da indústria deve ser encarada pelas autoridades econômicas do país como um alerta", destacou a entidade, em nota, pedindo que a retração seja levada em conta pelo Banco Central na política de juros para frear a inflação.