Título: Governo terá dificuldades para reduzir a demanda
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/03/2011, Economia, p. B2

No ano passado foi dada prioridade para a demanda doméstica que, pelos dados do PIB, cresceu 7,0%, ante 4,2% no ano anterior. Aumento dos rendimentos, especialmente no setor público, crédito mais fácil e consignado e prazos largos de prestações impulsionaram essa expansão.

O inconveniente é que a produção industrial não conseguiu acompanhar a expansão, que foi atendida essencialmente por um aumento da importação numa economia de pleno emprego, o que favoreceu as pressões inflacionárias.

Existe um consenso: a economia brasileira não pode continuar mantendo uma taxa de 7,5% do PIB sem criar uma inflação que se tornaria incontrolável. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, admite um crescimento do PIB entre 4,5% e 5,0%, o que exige um forte afrouxamento da demanda doméstica.

A questão é de saber se, no contexto econômico atual, será possível controlar a demanda. Diversos fatores indicam que será uma tarefa muito difícil, embora a presidente Dilma Rousseff pareça firme nesse objetivo.

Já em fevereiro, com um aumento emblemático de 12,0 % nas vendas de automóveis, tivemos um aviso das dificuldades para conduzir a demanda doméstica a menores níveis.

O programa de austeridade fiscal agora lançado, mesmo implementado com firmeza, não será capaz de levar os gastos do governo federal para muito abaixo dos do ano passado. Temos um aumento do salário mínimo que se traduz em majoração das aposentadorias, uma elevação dos salários dos funcionários públicos, um peso maior das despesas com juros da dívida mobiliária interna e externa, e os desembolsos para a construção civil continuarão elevados.

Mesmo admitindo um aumento do desemprego, esse será pequeno e não afetará os trabalhadores especializados, cuja demanda continuará forte.

Está se verificando que as medidas tomadas em dezembro para esfriar a demanda têm um efeito muito limitado e que nem o aumento das taxas de juros, depois de dois aumentos sucessivos da Selic, está contribuindo para reduzir a demanda. O afrouxamento dessa é notado apenas nos gastos correntes (alimentação), pela elevação dos preços que, ao que parece, deverá persistir. No entanto, para os bens de valor mais elevado as famílias levam em conta apenas o montante da prestação mensal que permite adquiri-los. Somente uma regulamentação severa das vendas a prestações conseguiria reduzir realmente a demanda, medida que dificilmente o governo deverá adotar.