Título: União Europeia pressiona Portugal a pedir pacote de socorro de ¿ 75 bilhões
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/03/2011, Economia, p. B10
Primeiro-ministro demissionário José Sócrates ainda resiste à ideia, mas autoridades europeias admitem que resgate está sendo discutido
Ezequiel Scagnetti/ReutersDestaque. José Sócrates, que na véspera pediu demissão do cargo de primeiro-ministro de Portugal, chega para a reunião de cúpula do Conselho Europeu Chefes de Estado e de governo da União Europeia (UE), liderados pela chanceler da Alemanha, Angela Merkel, pressionavam na noite de ontem Portugal a aceitar um pacote de socorro da ordem de ? 75 bilhões, com o objetivo de evitar a insolvência das contas públicas do país.
O cerco foi exercido sobre o primeiro-ministro demissionário, José Sócrates, durante o primeiro dia da reunião de cúpula do Conselho Europeu, iniciada ontem, em Bruxelas. À espera de respostas, as agências de classificação de risco Standard&Poor"s e Fitch rebaixaram a nota portuguesa.
A elaboração de um pacote de socorro a Portugal, o terceiro da zona euro - depois da Grécia e da Irlanda, em 2010 -, se tornou iminente na quarta-feira, quando um novo arsenal de medidas de rigor - o chamado PEC 4 - foi rejeitado pelo Parlamento. Em consequência, Sócrates apresentou ao presidente do país, Aníbal Cavaco Silva, a demissão de seu gabinete, transformando a turbulência econômica em crise política.
Ontem, Sócrates encontrou-se com Angela Merkel, antes de participar da cúpula. Na mesma tarde, Jean-Claude Juncker, premiê de Luxemburgo e coordenador do Fórum de Ministros de Economia e Finanças (Ecofin) da zona euro, admitiu que o pacote de socorro já está sendo discutido, ainda que Portugal resista.
Questionado pela rede de TV France 24 sobre o programa de auxílio, Juncker afirmou: "Não excluo essa hipótese". Sobre o valor do programa, estimado em ? 75 bilhões, Juncker completou: "É apropriado". O montante fica na média das estimativas feitas por especialistas, como os do Royal Bank of Scotland (RBS), que ontem previram um programa de resgate de ? 80 bilhões.
Didier Reynders, ministro de Finanças da Bélgica, confirmou a perspectiva de uma linha de crédito de emergência. "Sempre pensei que seria útil organizar uma ajuda, porque permite reduzir os encargos sobre a dívida e exigir menos esforços à população", ponderou. "Estamos prontos para intervir e ajudar, assim que Portugal pedir."
Para tanto, o presidente da Comissão Europeia, o português José Manuel Durão Barroso, exortou o país a resolver sua crise política. "Eu espero que as dificuldades políticas que surgiram em Portugal sejam resolvidas assim que possível", afirmou. "É importante para a confiança na economia portuguesa que o consenso sobre a necessidade de levar adiante a consolidação fiscal e as reformas estruturais, que eu penso existir em Portugal, seja claramente reafirmado."
Divergências. A pressão da UE visa a encurtar o período de gestação do plano de salvamento, de forma a reduzir a exposição do euro nos mercados financeiros, como ocorrera em 2010. No entanto, o gabinete demissionário ainda insiste que o plano, por ora, é dispensável. "O governo continuará a combater a ideia de recorrer a uma ajuda estrangeira", afirmou o porta-voz do governo, Pedro Silva Pereira.
A pressa por um novo programa de socorro na zona euro é também do mercado financeiro. Ontem, a S&P rebaixou o rating da dívida soberana de Portugal em dois graus, para BBB, com perspectiva negativa, citando o aumento da incerteza política . A Fitch também rebaixou a nota dos títulos da dívida de A+ para A-, justificando a decisão pelos "crescentes riscos de implementação política e financiamento na sequência da não aprovação das novas medidas de consolidação fiscal".
Se confirmado o empréstimo, os recursos serão mais uma vez provenientes do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira e do Fundo Monetário Internacional (FMI), com apoio do Banco Central Europeu (BCE), as mesmas instituições que intervieram na Grécia e na Irlanda.
Mercado. O euro subiu ontem revertendo o declínio da quarta-feira, com as expectativas de aumento do juro pelo BCE se sobrepondo às preocupações com a crise da dívida da zona do euro. Os analistas acreditam que o impacto da rejeição do plano de austeridade português sobre o euro deve ser limitado por enquanto. No fim da tarde em Nova York, o euro era negociado em US$ 1,4177, de US$ 1,4087 na véspera. Os índices das principais bolsas europeias fecharam em alta. / COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS
PONTOS-CHAVE
Crise da dívida O primeiro-ministro de Portugal, José Sócrates, renunciou na quarta-feira depois de o Parlamento rejeitar novo pacote de austeridade para controlar a crescente dívida pública do país
Foco A crise em Portugal está no centro da reunião de cúpula do Conselho Europeu. O premiê de Luxemburgo, Jean-Claude Juncker, admite que um plano de resgate já estava sendo discutido Projeção
75 bilhões é a estimativa de quanto deve custar o socorro a Portugal. Antes, Grécia e Irlanda tiveram de abrir mão da mesma ajuda
Vácuo político Pelo procedimento formal, com a renúncia de Sócrates, o presidente Cavaco Silva deve iniciar hoje consulta aos partidos para decidir a formação, ou não, de novo governo antes das eleições