Título: Ampliada área de risco em Fukushima
Autor: Trevisan, Cláudia
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/03/2011, Internacional, p. A18

Correspondente/Pequim

O governo japonês aconselhou ontem as pessoas que moram no raio de 20 km a 30 km da usina atômica de Fukushima-Daiichi a deixarem a região voluntariamente, em mais um indício de que a crise nuclear provocada pelo duplo desastre natural que atingiu o país no dia 11 está longe do fim.

O primeiro-ministro Naoto Kan reconheceu ontem em entrevista coletiva que a situação na usina continua "extremamente grave e séria" e não dá margem ao "otimismo". Horas antes, o porta-voz da agência de segurança nuclear, Hidehiko Nishiyama, havia declarado que os altos níveis de radiação detectados na quinta-feira indicam que a estrutura do reator 3 da planta foi danificada. A possível consequência do dano é a redução da capacidade do reator de conter vazamentos de material radioativo em grandes proporções, observou Nishiyama.

A água que contaminou dois funcionários da usina anteontem apresentava radiação em um nível 10 mil vezes superior ao registrado normalmente no local. Com botas curtas, os operários ficaram expostos durante 50 minutos a uma poça de água de 15 centímetros, que queimou a pele de suas pernas.

Um dos homens tem cerca de 30 anos e recebeu 180,7 milisieverts de radiação. O outro, na casa dos 20 anos, foi exposto a 179,37 milisieverts. Habitantes de países industrializados recebem em média 3 milisieverts de radiação por ano.

No começo da crise, o Ministério da Saúde do Japão elevou de 100 milisieverts para 250 milisieverts o limite máximo de exposição à radiação por trabalhadores de usinas nucleares, mudança que permitiu a presença de operários na usina de Fukushima para tentar evitar o superaquecimento dos seis reatores da central.

Nós últimos dias, 536 pessoas trabalhavam no local, incluindo integrantes do Corpo de Bombeiros e do governo japonês. Até ontem, 17 delas haviam sido contaminadas com nível de radiação superior a 100 milisieverts.

Fukushima entrou em colapso após o terremoto seguido de tsunami que atingiu o Japão no dia 11. O tremor de terra interrompeu o fornecimento normal de energia às bombas que garantiam o fluxo de água para resfriar os reatores e as piscinas de armazenamento de combustível usado. O tsunami impediu a operação dos geradores que deveriam entrar em ação ni caso de falha no abastecimento regular de eletricidade. Com isso, o nível de água na usina baixou, desencadeando um processo de aquecimento do material nuclear. Desde o início da crise, o Japão tem usado água do mar para tentar evitar o derretimento dos reatores, o que poderia causar um vazamento de radiação de grandes proporções.

Os EUA anunciaram ontem que enviarão ao Japão um navio carregado com água doce para realizar a operação de resfriamento da usina. Os americanos acreditam que o uso de água do mar pode danificar ainda mais os equipamentos da planta.

Diferentes níveis de radiação foram detectados nos últimos dias em vegetais, verduras, água do mar, água encanada e solo de regiões localizadas até 300 km de distância da usina de Fukushima. Ao menos seis cidades constataram a presença de iodo-131 na água encanada em níveis superiores ao considerado seguro para bebês com menos de 1 ano.

O porta-voz do governo Yukio Edano ressaltou que a retirada dos moradores no raio de 20 km a 30 km da usina não é obrigatória, mas é uma precaução para o caso de os níveis de radiação no local subirem nos próximos dias.