Título: Das espécies ameaçadas em todo o mundo, 15% estão em zoológicos
Autor: Balazina, Afra
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2011, Vida, p. A29

Estudo mostra importância de zoos e aquários para a conservação de animais em risco de extinção e defende que cada unidade pode contribuir mais ao se especializar na criação de poucas espécies em risco, em vez de tentar aumentar a diversidade

Espécies como o bisão-americano, o condor-da-califórnia, o cavalo-de-przewalski e o furão-do-pé-preto foram salvas da extinção graças ao trabalho de reprodução em zoológicos. A continuidade da ararinha-azul, que já foi extinta na natureza, também depende do sucesso do trabalho realizado em cativeiro.

Werther Santana/AESobrevivente. Ararinha-azul, já extinta na natureza, e o diretor do zoo de SP, João da Cruz Atualmente, os zoológicos no mundo todo abrigam representantes de cerca de 15% dos animais ameaçados. E cada vez mais especialistas dizem que não se pode menosprezar a importância dos zoos e aquários para a conservação.

Porém, a situação é bastante desigual: os zoológicos possuem exemplares de 20% a 25% das espécies de mamíferos e aves ameaçados ou quase ameaçados, mas apenas 3% dos anfíbios nas mesmas condições. E os anfíbios, segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), são o grupo mais ameaçado entre os vertebrados terrestres, atualmente.

Os números foram publicados na revista Science. Os pesquisadores usaram dados do Sistema Internacional de Identificação de Espécies (Isis, na sigla em inglês). De acordo com o estudo, cada zoo pode ter uma contribuição maior para a conservação ao se especializar na criação de poucas espécies em risco, em vez de tentar aumentar a diversidade de espécies - a especialização, afirmam, faz crescer a chance de sucesso na reprodução.

O autor principal do estudo, Dalia Amor Conde Ovando, do Instituto Max Planck, da Alemanha, disse ao Estado que é difícil determinar qual seria a porcentagem ideal de animais ameaçados em cativeiro. "Porém, acho que precisamos ter uma priorização para garantir que teremos uma apólice de seguro das espécies que estão mais ameaçadas. Isso é ainda mais urgente para as espécies que são vulneráveis às mudanças climáticas", afirmou.

Ele ressalta ainda um fato que achou impressionante durante a pesquisa. "A Associação Mundial de Zoos e Aquários (Waza) é a terceira maior fonte de financiamento para conservação, atrás apenas das ONGs WWF e The Nature Conservancy (TNC). Cerca de US$ 350 milhões (R$ 580,4 milhões) são destinados a cada ano pelos zoos ligados à Waza para a conservação de espécies em seus hábitats naturais", disse.

Trabalho de campo. O presidente da Sociedade de Zoológicos do Brasil, Luiz Pires, avalia que hoje no Brasil a maior parte dos 127 zoos trabalha com conservação, educação, pesquisa e promoção do lazer à população voltado à educação.

Ele cita que o zoo de Curitiba tem um trabalho interessante na conservação do muriqui, o maior primata das Américas, e o zoo de Brasília faz o mesmo com a ariranha. E o de Bauru, do qual é diretor, conseguiu nos últimos 20 anos ter 17 nascimentos de lobo-guará.

Mas ele destaca que os zoos não têm espaço nem recursos para cuidar de todos os animais ameaçados. Além disso, no País falta a complementação com trabalho de campo, diz, para permitir no futuro que as espécies retornem para a natureza, como ocorreu com o bisão-americano. "A população desse animal chegou a 50 indivíduos na natureza. Mas hoje a espécie foi reintroduzida ao hábitat natural."

Pires lembra outro exemplo positivo, dessa vez no Brasil: o mico-leão-dourado. A população da espécie reduziu-se a cerca de 600 indivíduos e hoje praticamente deixou para trás o status de ameaçada.

O zoo de São Paulo tem quatro exemplares da rara ararinha-azul, das cerca de 70 em cativeiro no mundo. São dois machos e duas fêmeas, não expostas ao público. Mas não houve reprodução. O diretor técnico científico da instituição, João da Cruz, explica que uma das fêmeas tem atrofia ovariana. Um casal está quase formado. O outro macho deve ser enviado neste ano para as Ilhas Canárias, onde haverá uma tentativa de reprodução.

Limite

LUIZ PIRES PRESIDENTE DA SOCIEDADE DE ZOOLÓGICOS DO BRASIL

"A lista de espécies em risco brasileira só aumenta a cada ano. Não damos conta, não somos a arca de Noé."

ESPÉCIES EXTINTAS NA NATUREZA

Ararinha-azul

O último exemplar da espécie foi avistado na Bahia em 2000. Hoje, existem cerca de 70 indivíduos em cativeiro no mundo, a maior parte no exterior. No Catar estão 53 dessas aves.

Mutum-do-nordeste (ilustração)

A ave que ocorria na Mata Atlântica de Alagoas e Pernambuco desapareceu da natureza na década de 1980. Também sobrevive graças à reprodução em cativeiro - hoje, a população conta com cerca de cem exemplares.

Pomba-socorro

Ocorria num arquipélago do México e foi exterminada por gatos que foram introduzidos no local. A última vez que a avistaram foi em 1972. Segundo os autores do estudo publicado na revista Science, ela é criada em pelo menos 20 zoos.

Corvo-do-havaí

A última ave da espécie nativa do Havaí foi avistada em 2002. Em 2010, havia 78 indivíduos em cativeiro nos Estados Unidos. A cada ano, cerca de 2 mil alunos participam de um programa de educação ambiental e observam a espécie em cativeiro, no Centro de Conservação de Aves Keauhou.

Cervo-do-padre-david

Apesar de ainda ser considerada extinta na natureza, a população da espécie nativa na China tem crescido nos últimos anos em cativeiro e há possibilidade de reintroduzir o animal à vida selvagem. Quando isso ocorrer, seu status na lista vermelha será revisto. Está presente em pelo menos 56 zoos.

Antílope Oryx dammah

O animal ocorria no norte da África, mas há 15 anos não há mais evidência de exemplares na natureza. Até 1985, cerca de 500 exemplares da espécie viviam em Chade e Níger, no continente africano. De acordo com o estudo na Science, há exemplares da espécie em 103 zoos. Segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza, só nos Emirados Árabes há 4 mil animais da espécie em cativeiro.