Título: Reitor não tem como ser autoritário
Autor: Mandelli, Mariana
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/04/2011, Vida, p. A28

Rodas diz que só pode tomar decisões após os pareceres dos órgãos colegiados e, por isso, não trabalha sozinho

ENTREVISTA - João Grandino Rodas, reitor da Universidade de São Paulo

O reitor da USP, João Grandino Rodas, afirma que no primeiro ano de sua gestão foram iniciados o planejamento e a implementação de projetos em todos os câmpus. Diz também que ele e os demais dirigentes continuam abertos ao diálogo. Abaixo, a entrevista que ele concedeu ao Estado, por e-mail, sobre seu primeiro ano à frente da USP.

Quando o sr. assumiu, em janeiro de 2010, havia um histórico de descontentamento na USP de professores, alunos e funcionários. O sr. acha que está conseguindo apaziguar os ânimos?

A grande maioria que compõe a USP prefere o silêncio, enquanto uma minoria, ideológica e politicamente ativa, tendo à frente os mesmos dirigentes desde a década de 60, promove anualmente paralisações e invasões, sem se preocupar com os princípios fundamentais do Estado de Direito. O apaziguamento das relações depende da ação de alunos, professores e funcionários e não apenas dos dirigentes centrais da universidade. Nos últimos anos, a estratégia dos ativistas tem sido imputar ao reitor de plantão a pecha de autoritário e todas as mazelas da USP, tentando desmoralizar o modelo vigente de universidade e da própria sociedade. Para eles, qualquer meio é justificável para alcançar o fim. Mas nada justifica o vandalismo, o impedimento do direito de ir e vir, as ofensas pessoais e os constrangimentos, vindos de uma minoria que está em patamares acadêmicos e salariais absolutamente acima da média geral dos paulistas e dos brasileiros.

Qual o balanço que o senhor faz do primeiro ano de gestão?

No que tange à infraestrutura, estão sendo promovidas a revitalização do câmpus de São Paulo e de Lorena, este para que se torne um polo de engenharia no Estado e no Brasil, e a implementação de um sistema que integre todos os câmpus em rede. Quanto à pesquisa, a universidade está investindo R$ 50 milhões em um projeto de apoio aos núcleos. No campo da extensão e da cultura, destacaria a implantação da Praça dos Museus, com a construção de novos edifícios para os museus de Arqueologia e Etnologia, de Zoologia e de Ciências. Brevemente, será iniciada a construção do Centro de Convenções. Em relação à internacionalização, crucial para a melhora da USP nos rankings, está sendo implementado o Centro de Difusão Internacional e a moradia estudantil para estrangeiros. Quanto aos recursos humanos, estão em estudo novos projetos de carreira, tanto para docentes quanto para os funcionários técnico-administrativos. Também estuda-se a melhora dos benefícios que possibilitem a permanência de alunos com necessidades socioeconômicas.

Por que certas medidas da reitoria despertam tanta impopularidade? Como vê as críticas de autoritarismo?

O reitor somente pode tomar decisões após os pareceres dos órgãos colegiados. Assim, não existindo decisão pura e simples do reitor, não é possível autoritarismo por parte dele. É curioso: quando se trata de uma decisão considerada aceitável, publica-se: "A USP decidiu ...". Quando se quer atacar uma decisão, escreve-se: "O reitor mandou..." Mudanças normalmente são incômodas e podem servir até mesmo para causar contestações. Contudo, se a USP deseja trilhar seu caminho de excelência, elas são absolutamente necessárias.

Por que ocorreu a demissão de funcionários aposentados?

O desligamento de funcionários aposentados pelo INSS que continuavam na ativa foi legal e ético. A legislação e a jurisprudência brasileiras permitem o desligamento nos casos efetuados, desde que recebam aviso prévio, 13.º salário e férias, além de 40% do depósito do FGTS. Ademais, todos receberam outros apoios, como a continuidade de utilização de serviços médicos. A boa administração impõe a renovação do quadro funcional, bem como a passagem do conhecimento aos funcionários mais jovens.

Qual a opinião do sr. sobre as polêmicas na USP Leste (EACH)?

Há algum tempo a própria EACH discute internamente a atualização de seus cursos, pois cada unidade da USP possui relativa autonomia. Quanto à faculdade enviar suas posições consensuais, elas serão examinadas pelos órgãos centrais para a tomada de decisão.

A FIA (fundação privada criada por professores da Faculdade de Economia e Administração da USP) anunciou o primeiro curso de graduação pago. O senhor é a favor do projeto?

Prefiro não me pronunciar sobre instituição que não faz parte da USP.

Há também um grande questionamento em torno da saída de departamentos do câmpus, das obras anunciadas e da compra de terrenos. O que justifica essas medidas?

Há décadas que o câmpus central da USP precisa ser revitalizado, pois infraestruturas, dentre as quais a predial, são fundamentais para o cumprimento dos fins da universidade. Obviamente, era necessário alojar condignamente os órgãos que se encontravam em local deteriorado. Foram feitas aquisições dentro das necessidades e conforme todos os parâmetros da administração pública. Quase todos voltarão assim que os prédios novos estiverem terminados. A exceção fica por conta do escritório da USP no Centro Empresarial (em Santo Amaro), pois todo órgão de porte deve possuir local resguardado, que assegure seus serviços computacionais essenciais.

E o diálogo com os segmentos da USP, como fica?

No primeiro ano da administração foi dada ênfase ao diálogo direto, contínuo, transparente e também responsável. Responsável quer dizer com pautas claras, interlocutores definidos e prazos. Eu e as demais autoridades centrais continuamos abertos ao diálogo com os pressupostos acima. Não é aceitável o pseudodiálogo que se arrasta, com pautas que aumentam assim que as primeiras reivindicações são aceitas, com interlocutores que mudam a cada dia e servem somente para afirmar, após semanas de conversa infrutífera, que a administração é infensa ao diálogo, justificando assim o uso da força bruta.