Título: Protesto afegão contra pastor dos EUA acaba com 11 mortes em sede da ONU
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/04/2011, Internacional, p. A16

No pior ataque contra a ONU no Afeganistão, pelo menos sete funcionários estrangeiros e quatro cidadãos afegãos morreram ontem quando um protesto contra a queima do Alcorão nos EUA se transformou em um ataque contra um edifício das Nações Unidas na cidade de Mazar-i-Sharif, no norte do Afeganistão. Dois dos funcionários estrangeiros da ONU teriam sido decapitados.

Há dez dias, o grupo do polêmico pastor protestante Terry Jones queimou um exemplar do Alcorão em uma igreja da Flórida. Eles realizaram um "julgamento" dentro da igreja diante do fieis e acusaram o livro sagrado muçulmano de ser o culpado por crimes. Ao final, executaram a pena contra o Alcorão.

Mas a iniciativa dos pastores foi duramente criticada até mesmo pelo presidente do Afeganistão, Hamid Karzai, que qualificou o ato de "crime contra a religião" e pediu ação dos EUA.

Ontem, cerca de 2 mil pessoas haviam se reunido de forma pacífica nos portões do prédio da ONU para protestar contra os pastores americanos e pedir o fim da intervenção internacional no país, após as orações tradicionais de sexta-feira. Segundo as investigações feitas pela ONU, imãs sugeriram aos fieis que "atacassem" as forças estrangeiras que ocupam o país.

A manifestação ganhou contornos dramáticos quando um grupo tentou roubar as armas dos seguranças da ONU e passou a atacar o prédio com pedras, tentando pular o muro que protegia o edifício. Segundo a entidade, alguns dos manifestantes estavam armados e abriram fogo contra os policiais. O incidente acabou permitindo que a segurança do edifício fosse controlada pelos manifestantes, que invadiram o prédio. Alguns escritórios foram incendiados.

Pelo menos quatro seguranças do Nepal que protegiam a entrada da ONU foram mortos, segundo o comandante da Polícia Nacional Afegã, general Daud Daud. Dois deles teriam sido decapitados, ainda que a ONU tenha optado por não confirmar o fato. O chefe da missão da ONU no local foi gravemente ferido.

Segundo o porta-voz da ONU, Dan McNorton, outros três funcionários internacionais foram mortos, de nacionalidade norueguesa, sueca e romena. Não há brasileiros entre os mortos. José Francisco Siebert Luz, um brasileiro que trabalha para a ONU no Afeganistão, afirmou ao Estado que estava em Cabul no momento do ataque.

O governo afegão indicou que quatro manifestantes também foram mortos. Mas o número total de vítimas poderia chegar a 20, de acordo com fontes médicas, como Mirwais Zabi, diretor do hospital em Mazar-i-Sharif.

Segundo o porta-voz da polícia da cidade, Lal Mohammed Ahmadzai, insurgentes se infiltraram na manifestação até então pacífica e teriam aproveitado a ocasião para cometer o crime. Quinze pessoas foram detidas. Funcionários da ONU disseram que o restante dos manifestantes pediam "morte aos EUA" e "morte a Israel".

Em Cabul, 200 pessoas também se manifestaram contra a queima do Alcorão diante da embaixada americana. Apesar da queima de bandeiras americanas, não houve violência.

Após os incidentes, a Rússia pediu ao governo afegão e às forças da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) no país que protejam as equipes da ONU. Ban Ki-moon, secretário-geral da ONU, qualificou os ataques de "covardes".