Título: Mercado ignora governo e dólar vai a R$ 1,58
Autor: Modé, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/04/2011, Economia, p. B6
Um dia depois do anúncio de medida contra a desvalorização do dólar, cotação cai 1,73% , para o menor valor desde agosto de 2008
Os investidores ignoraram a nova medida do governo para tentar conter a valorização do real ante o dólar. A moeda americana encerrou a quinta-feira valendo R$ 1,586, queda de 1,73% na comparação com o dia anterior, quando o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fez o anúncio.
A desvalorização de ontem foi a maior em um único dia desde junho do ano passado e a cotação é a menor desde agosto de 2008. No acumulado do ano, o real é a sexta moeda que mais ganha ante o dólar, atrás, entre outras, da coroa dinamarquesa e da coroa norueguesa.
Mantega estendeu para dois anos o prazo de empréstimos contraídos no exterior que terão de pagar Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Antes, o prazo era de até um ano. Ou seja, empresas e instituições financeiras que tomarem crédito lá fora dentro desse período terão de recolher o tributo.
No mercado financeiro, consolida-se a percepção de que o governo pouco pode fazer para evitar a alta da moeda brasileira - a menos que opte por soluções radicais, como controle de capitais, o que certamente reduziria investimentos estrangeiros num momento em que o País precisa muito desse capital. Basta lembrar que, em 2014, o Brasil será sede da Copa do Mundo e, em 2016, das Olimpíadas.
Segundo especialistas, o movimento decorre de fatores internos e externos. O vice-presidente executivo de Tesouraria do banco WestLB, Ures Folchini, lista alguns relacionados especificamente ao Brasil. "Somos um país grande que cresce bem, temos um mercado financeiro sólido e com regras bem definidas", exemplificou. "Pagamos o preço do sucesso."
Do lado externo, observa o economista-chefe da Sul América Investimentos, Newton Rosa, há enorme liquidez. Essa dinheirama decorre da política monetária adotada pelos países desenvolvidos desde a eclosão da crise global, em setembro de 2008.
Essas nações colocaram suas taxas de juros básicas nos níveis mais baixos dos últimos anos. Com isso, o investidor global procura ativos com potencial maior de valorização. Os brasileiros estão no topo da lista, pois a taxa de juros aqui é a mais alta do planeta - 11,75% ao ano. Além disso, as perspectivas de crescimento tornam outros ativos, como ações, atraentes também.
Ontem, o Banco Central Europeu (BCE) elevou o juro básico de 1% para 1,25% ao ano. Em compensação, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) tem dado sinais de que não vai mexer no juro básico (que está entre 0 e 0,5% ao ano) tão cedo. "Os investidores só vão mexer na distribuição de recursos no mundo quando o Fed começar a mudar o juro básico", afirmou Newton Rosa.
Rosa e Folchini avaliam que o governo só conseguiria um efeito mais forte na contenção do real se fizesse um ajuste fiscal profundo. Esse ajuste abriria espaço para a redução do juro, o que, por sua vez, diminuiria a atração de capital externo.
O diretor executivo da NGO Corretora, Sidnei Nehme, discorda dos colegas e acha que o governo ainda tem bala na agulha. "Poderia haver alguma medida que impactasse as posições vendidas dos bancos em dólar", afirmou. Segundo ele, as instituições vendem a moeda americana e os reais da transação acabam migrando, por exemplo, para a concessão de empréstimos. "É preciso fechar essa janela."